quinta-feira, 25 de junho de 2020

DINÂMICAS PANDÉMICAS TERRITORIAIS MAIS RECENTES



(A passagem do epicentro da pandemia após desconfinamento para o coração da aglomeração de Lisboa tem suscitado interpretações diversas, parecendo não existir ainda uma interpretação que se sobreponha a todas as outras, penalizando seriamente a comunicação dos agentes públicos. Tenho seguido os números dos últimos dias numa tentativa de melhor conhecer o terreno que piso em desconfinamento e ensaio neste post algumas explicações possíveis.)

Reportando a minha análise aos três últimos dias, o foco pandémico que paira sobre o coração da aglomeração metropolitana de Lisboa é demasiado evidente para poder ser ignorado. Vejamos os principais números:

Coração da aglomeração metropolitana
Números de novos casos nos últimos 3 dias (23 a 25 de junho)
Amadora
110
Cascais
43
Lisboa
127
Loures
66
Odivelas
119
Oeiras
40
Sintra
163
Vila Franca de Xira
68
Total
736

Em torno deste coração metropolitano, podemos anotar ainda alguma dinâmica de novos casos na Península de Setúbal e no Médio Tejo e Lezíria:

Médio Tejo e Lezíria
Números de novos casos nos últimos 3 dias (23 a 25 de junho)
Azambuja
10
Benavente
3
Coruche
1
Entroncamento
1
Moita
20
Montijo
2
Palmela
5
Salvaterra de Magos
1
Santarém
24
Setúbal
21
Tomar
2
Total
90

Adicionemos ainda a estes números os do Oeste e região de Leiria:

Oeste e Região de Leiria
Números de novos casos nos últimos 3 dias (23 a 25 de junho)
Arruda dos Vinhos
1
Bombarral
1
Cadaval
2
Caldas da Rainha
6
Leiria
10
Mafra
9
Ourém
8
Peniche
14
Porto de Mós
4
Torres Vedras
5
Total
60

Para além destas evidências, temos essencialmente os surtos de Reguengos de Monsaraz e de Lagos a marcarem respetivamente as incidências no Alentejo e no Algarve, um número reduzido de casos na região de Aveiro (Aveiro e Vagos), o mesmo no Tâmega e Sousa em Marco de Canavezes e a incidência metropolitana a norte limitada a Vila Nova de Gaia e a Espinho, respetivamente com 18 e 3 casos.

Como explicar esta inversão que parece estar associada ao processo de desconfinamento?

O início do epicentro no Norte esteve inequivocamente ligado à internacionalização da sua indústria, tal como o demonstram as cadeias de contágios a partir de pessoas que participaram em missões comerciais em Itália e em Espanha. O agravamento da situação determinou o confinamento do país e este encerramento beneficiou claramente a grande aglomeração de Lisboa durante algum tempo, pois o seu cosmopolitismo internacional que teria inapelavelmente reproduzido o número de casos importados viu cerceada a sua influência disseminadora. A inversão entretanto observada, visível sobretudo na comparação de hoje entre o número de casos totais confirmados entre o Norte e a região de Lisboa, com esta última agora na dianteira, parece ser um produto do desconfinamento. A pergunta de vários milhões consiste em saber porque razão o desconfinamento tem produzido esta inversão e este desequilíbrio norte-sul de casos confirmados?

Não esqueçamos que, por força do encerramento de fronteiras terrestres com Espanha e do transporte aéreo, a exposição a norte do cosmopolitismo industrial está como que suspensa. Com a exposição em suspenso dos dois cosmopolitismos diferenciados, o do Norte e o de Lisboa, terá jogado, penalizando a região de Lisboa, um outro conjunto de fatores: concentrações logísticas e maior massa de deslocações em transporte público em casa e trabalho, maiores concentrações de trabalho precário exposto a essas mesmas condições, maior densidade de bairros problemáticos. Este padrão de influência é compatível com os valores encontrados para os novos casos nas regiões algo mais distantes do coração metropolitano de Lisboa (Península de Setúbal, Médio Tejo e Lezíria, Oeste e Região de Leiria), mas não explica a razão da construção civil parecer emergir como setor problemático apenas na região de Lisboa. Continua a não estar disponível uma explicação plausível para essa evidência determinada pela testagem.

Estando anunciada a exposição internacional dos dois cosmopolitismos com a abertura de fronteiras com Espanha e do transporte aéreo pelo menos com a União Europeia, é uma incógnita como as duas principais aglomerações do país reagirão a essa abertura. Sem dados para tal intuição, gostaria de ensaiar alguma análise em torno dos dois modelos de desenvolvimento urbano das duas aglomerações, mais policêntrico o do Norte e mais concentrado o de Lisboa. Talvez esteja aí a raiz desta estranha inversão em desconfinamento.

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