(A vastíssima dimensão do território americano tem
disfarçado a autêntica tragédia de incidência da pandemia nos EUA e a situação
chegou a um ponto impensável para um sensato cidadão de qualquer país, credo ou
religião. O simples uso de uma máscara de proteção tornou-se um fator de
clivagem política, com os Democratas dominantemente a usá-la e os Republicanos
reféns de Trump a evitá-la em grande medida, como o podemos ver no mais recente
comício em Tulsa. Quando o culto da ignorância se
transforma em arma política de arremesso, estamos conversados e compreendemos
quão baixo pode descer o populismo mais reles. Saúdo com esta reflexão o
regresso de Krugman como inspiração destas crónicas.)
Os representantes mais convictos do populismo reles de última geração,
Trump e Bolsonaro, atiraram os respetivos países para uma tragédia de grandes
proporções que a sua vasta dimensão disfarçou, em parte, mas que, por outro
lado, cria condições para uma difusão pandémica mais prolongada, como está
agora a ser comprovado.
Com tanta incerteza a enquadrar a proteção face à pandemia, a distância
física (e não distância social como o Professor Michael Osterholm da Universidade
de Minnesota em entrevista ao Blue Zones brilhantemente o caracterizou, link aqui) e o uso
de máscaras constituem praticamente as únicas defesas de proteção. Ora, Trump e
Bolsonaro têm feito tudo para torpedear essas proteções seguras, promovendo
toda a série de iniciativas que comprometem a manutenção de distância física
entre pessoas e criando voluntariamente todas as formas de vulgarização do não
uso de máscara. Estou a ficar cada mais pérfido nas minhas interpretações e
creio que, no caso de Bolsonaro, ele encontrou uma via “eficaz” de afastamento
do seu caminho de um grande conjunto de pessoas que ainda respira pela
inspiração de Lula. Afinal será dominantemente entre os mais fracos e mais
pobres que a devastação brasileira vai ter maior incidência e sempre que vejo
as manifestações de apoiantes de Bolsonaro mais me convenço desta segmentação.
Mas o que une mais Trump e Bolsonaro é o culto da ignorância, agora
transformada em jogos individuais de roleta russa, em voos individuais
Kamikase, que podem virar de repente suicídios coletivos. Mais do que simples
desinformação ou manipulação, o que temos é o culto da ignorância transformado
em orgulho e em arma de arremesso político.
Paul Krugman (link aqui) que regressa a este blogue como fonte de inspiração de uma
crónica pormenoriza esta nova forma de utilização do culto da ignorância,
salientando que o simples uso de uma máscara se transformou em fonte de divisão
política, com os Democratas dominantemente a respeitar o seu uso e os
Republicanos a borrifarem-se em grande medida para a medida. Aonde chegamos
Deus meu.
Nota final sobre como vamos por cá penando:
Os pontos mais frágeis da sociedade portuguesa vão sendo um a um revelados
pela continuidade pandémica: (i) precariedade das relações de trabalho, baixos salários
consequentes problemas de solvência para uma habitação digna; (ii) défice
crónico de instituições para os mais velhos e uma massa importante de
instituições informais que só existem com a complacência de quem compreende que
a procura excede irremediavelmente a oferta; (iii) irresponsabilidade juvenil
que vai assumindo com dez ou vinte anos de atraso ondas de comportamento que
nos chegam da Europa; (iv) concentrações logísticas privadas de grande porte
que se combinam com a precariedade, a habitação não decente e a concentração de
procura de transporte público; (v) inconsistências comunicacionais dos nossos
muitos papagaios que transformam a metáfora da picareta falante em modelo
ultrapassado. E alguém tem dúvidas de que neste contexto de fragilidade o pleno
funcionamento das Escolas é uma bomba de deflagração lenta?
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