sexta-feira, 30 de outubro de 2020

LETTER TO YOU

 

(O BOSS é inesgotável. A sua autenticidade e a presença permanente das suas raízes alimentam uma torrente criativa que no ambiente único da E-Street Band e das suas memórias encontra o espaço de conforto para se manifestar pujante e sempre renovada. LETTER TO YOU, o documentário que a APPLE TV nos oferece é um monumento único, um tempo de esperança, de ânimo e sensibilidade neste momento tão complexo ...)

Eu bem sei que, nestes tempos de incerteza, de confinamento sem estar confinado, a minha sensibilidade está no auge, que estou um sentimentalão, recetivo a qualquer mensagem mais forte que me toque. Ressalvado este contexto, posso-vos dizer que a visualização do documentário de Bruce Springsteen apresentado pela APPLE TV e produzido em torno da gravação do LETTER TO YOU é um monumento de televisão (trailer aqui).

Claro que o Bruce é um caso à parte, envolvendo avô, filhos e pelo menos o meu neto Pedro que delirava com os “You Tubes” do Bruce ainda há muito pouco tempo. A leitura do BORN TO RUN, a autobiografia de Bruce, preparou-me para este filme, não tenho dúvidas sobre isso. O LETTER TO YOU é em termos musicais Springsteen no auge da sua criatividade, sempre atento à herança incontornável de Dylan e trabalhando as suas raízes e de adolescente cedo órfão de Pai, embora com ele tivesse uma relação tumultuosa.

Mas o que encanta na produção para a APPLE TV é a ambiência única da criação coletiva da E-Street Band a partir da visão individual de Bruce. Entrecortando imagens belíssimas sobre a neve caindo no rural e na floresta americana com o contexto de cada canção, o filme acompanha a gestação criativa da Banda, canção a canção, sempre precedida de uma reflexão sobre os temas que deram origem às canções que integram este último álbum. Do lirismo mais simples e comovente à força daquelas batidas empolgantes que só a E-Street consegue arrancar, sempre com a memória e recordação do Clarence Clemons (penso que Jack Clemons será seu filho) e do Danny Federici a pairarem naquela atmosfera criativa, vamos percebendo o significado e a felicidade que aquela atmosfera representa para o casal Springsteen -Scialfa.

Com o filme a caminhar para o fim, veio-me à ideia a convicção de que a obra de Springsteen e sobretudo este LETTER TO YOU representa bem o que a América nos anunciava, Democrata ou Republicana, antes de ser conspurcada pelo populismo mais brega de Trump e da degradação galopante das suas polarizações. Gostaria de ver o Bruce a juntar-se a um espetáculo de massas para comemorar uma eventual derrota de Trump, mas sei que isso pode ser uma esperança vã, tamanha é a confusão que se depreende das sondagens para a próxima terça-feira. A idade, o tempo, a morte, as raízes alimentam como temas a criatividade de Springsteen e compreendemos no fim que aquele álbum só poderia ter sido gravado naquela atmosfera, porque aquele ambiente criativo é genuíno e já faz parte da identidade do próprio BOSS.

E os versos finais:

(…)

In my letter to you

I took all my fears and doubts

In my letter to you

All the hard things I found out

In my letter to you

All that I found true

And I sent it in my letter to you

I sent it in my letter to you”.

Nota final:

Saúdo o meu colega de blogue pela liberdade deste novo tempo e hesito em congratular-me com o facto de não ter ficado associado a uma solução de governação para as CCDR que ambos criticámos de cima a baixo ou em me penalizar porque a sua presença na Presidência seria seguramente um travão a possíveis desvios que a perversidade da solução pode gerar. De qualquer modo, a liberdade para a crítica é um bem público e até pode ser que surja deste material de muitos anos material para uma reflexão conjunta mais estruturada sobre este país que nos tortura e encanta, por mais paradoxal que isso possa parecer. Pela minha parte e ainda influenciado pelo tom profundo do álbum de Bruce, é tempo de deitar cá fora ideias e combater o ruído que só atrapalha.

Abraço.

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