(Não há pior coisa para a descredibilização da política do que as meias-tintas, as coisas que ficam a pairar, aquilo que parece que é, que pode ser e que também pode não ser. Nos últimos tempos o PS parece apostado em querer movimentar-se por essas bandas. Não entendo que fundamentos pode ter essa orientação. Até porque o passado recente mostrou períodos em que sinais desse tipo foram ignorados por muita gente, de dentro e de fora do partido e como todos sabemos deram péssimos resultados, não apenas para a tribo, mas sobretudo para a comunidade)
Não sei por que carga de água se enraizou a ideia de que as segundas legislaturas trazem necessariamente efeitos de degenerescência. Essa visão vem do tempo das maiorias absolutas e essas são já uma coisa do passado. Neste caso, a primeira legislatura do PS pós Sócrates aconteceu com governo minoritário e acordo parlamentar à esquerda. A segunda, também minoritária, anda em busca de um novo racional cuja aprovação/rejeição do Orçamento para 2021 será o grande teste. As coisas estão mais feias, mas continuo a pensar que neste contexto de crise sincrónica da economia mundial e de impactos económicos sérios da pandemia será sempre mais fácil um acordo à esquerda do que noutra situação. A probabilidade de se tornarem necessárias intervenções que são caras à nossa esquerda parlamentar (proteção social, política de rendimentos, investimento público) constitui na minha perspetiva um campo favorável para o prolongamento, ainda que em novos moldes, dos acordos da geringonça.
Os sinais de degenerescência do comportamento político acontecem regra geral em contextos de maiorias absolutas e não em situações cujas saídas são estreitas e não se compadecem com tentações inebriantes de poder mais ou menos absoluto.
Posso admitir que algumas das derivas que têm chegado à comunicação social em que o PS se vê envolvido podem em alguma medida ser produto desta última. Os problemas do PS de Castelo Branco (sempre influente na orgânica do partido desde os tempos do Presidente Mourão), a estranha decisão sobre a nomeação de uma procuradora para um cargo europeu, a ida para chefe de Gabinete de António Costa do saltitão entre a política e a consultoria Vítor Escária (que passeou a sua categoria de influencer pela equipa de consultores do Augusto Mateus e associados , tudo boa gente do grupo dos preferidos da corte), o regresso dos amigos de Alex ao Conselho Geral Independente da RTP e este último caso do Tribunal de Contas e da substituição do seu Presidente são sinais ou alertas como que lhe queiram chamar. Devo vos dizer que não me sinto nada intimidado ou condicionado pelo facto destes temas terem sido presa recente do por vezes desbocado João Miguel Tavares no Público. É coisa que não me molesta e seguramente não me tira capacidade de juízo crítico sobre o que eles podem significar.
O editorial de Manuel Carvalho no Público, em que acredito como reconheço a sua sensibilidade para discutir as coisas e os sabores do Douro, é a meu ver um pouco ingénuo. Fui dos que compreendi o argumento apresentado por António Costa. Cargos com um único mandato podem (ou não, dependendo da forma como a pessoa concreta cumpre a sua função) estimular um mandato mais decidido e como Manuel Carvalho o admitiu o estranho é o primeiro-Ministro não ter atempadamente explicado a decisão e os seus fundamentos. Mas a revelação hoje feita por João Miguel Tavares de que o novo Presidente José Tavares rodou pelos círculos de Paulo Campos e companhia impactou a minha APP “Stay Away gente obscura”. Um humilde cidadão afastado das redes do poder precisa de guiões para o seu posicionamento em democracia. Para mim, há personagens à direita e à esquerda que são verdadeiros alertas de terreno possivelmente contaminado. Ora a minha preciosa APP tilintou que bastasse quando li esta referência. Se em política há companhias que se devem evitar, também para o exercício de cargos públicos se exige um comportamento similar. O Juiz José Tavares pode ser a melhor das pessoas e até pode conhecer por dentro o Tribunal de Contas melhor do que conheço a minha casa. Mas perdoem-me mas o nome Paulo Campos inspira-me cuidados e, regra geral, a minha APP não se engana.
Mas o que eu não entendo de todo é esta preferência pelo limbo dos terrenos equívocos que o PS atual parece interessado em retomar. Simples experimentação para ver em que moda param os condicionantes de opinião pública? Má informação de baixo para cima e, por conseguinte, decisões com suporte frágil de fundamentação? Pura teimosia para não se deixar condicionar pelo estatuto de governo minoritário? Sinais de tempos de saída? Por mais que me esforce não encontro fundamentação que valha. E quando assim acontece sinto-me inquieto. Tenho de arranjar uma outra APP.
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