terça-feira, 9 de março de 2021

TRIBUTO À MULHER

 

(Efemérides ou dias de qualquer coisa não são bem a minha especialidade e, por isso, opto por invocar o tema um dia depois. Considero que o tema do combate à discriminação de que a mulher ainda hoje padece no mundo do trabalho, na sociedade, em casa, nos efeitos da pandemia e na desigualdade constitui, a par do desafio climático, as duas grandes prioridades do caminho que o mundo tem a percorrer após pandemia. E considero ainda que a expressão da emancipação da mulher integra as grandes mudanças estruturais com que o desenvolvimento se identifica.

A idade não perdoa e por isso tenho vivência e recordações dos tempos em que a mulher não podia votar (só a partir de 1968 o pode fazer) e em que a grande maioria dos empregos públicos para licenciados pressupunha concursos a que as mulheres não podiam concorrer. Imagens da vida nos campos, em que o trabalho feminino de penosidade típica do trabalho forçado ocupa o centro dessas imagens, fazem parte do meu imaginário juvenil. E, em tempos mais recentes, há aquela imagem das aldeias de montanha nas cercanias de Marraquexe, em que duas mulheres totalmente curvadas pelo peso de fardos de lenha desciam a encosta íngreme e sinuosa numa viagem sei lá de quantos quilómetros.

Por outro lado, na minha vida universitária e profissional sempre tive experiências colaborativas de trabalho com mulheres de grande craveira e na pequena empresa de consultadoria em que trabalho a maioria dos quadros é do sexo feminino. Assisti ainda na minha vida universitária ao espantoso aumento da taxa de participação da mulher no ensino superior, revolucionando o panorama das qualificações em Portugal, embora com o conhecido défice de participação feminina nas chamadas áreas STEM (Science, Technology, Engineering and Mathematics), embora a ciência portuguesa atual esteja plena de nomes representativos que são mulheres e que Mulheres.

Esta revolução lenta é, por isso, bem anterior ao ativismo feminista mais recente e tão dividido ele está nos tempos que correm, como é o caso por exemplo do que se vem registando na vizinha Espanha, onde a questão da mulher faz parte do modelo estranho de uma coligação no poder que se combate ferozmente entre si (PSOE versus PODEMOS e a questão feminista a servir de combustão a essa luta no interior do próprio poder).

Não estou a sugerir que esse ativismo não é essencial para acelerar o processo de mudança, sem embargo dos radicalismos inconsequentes de que por vezes se alimenta. Foi isso que o processo de urbanização nos revelou, anunciando transformações que tiveram na mulher o seu epicentro, pelo menos do ponto de vista da sua entrada no mercado de trabalho e na procura do desenvolvimento profissional. Estou apenas a relembrar que estamos perante uma mudança estrutural que se confunde com o próprio desenvolvimento e que aquele ativismo pode acelerar mas não sobrepor-se ou substituir-se à ideia de mudança social de mais largo espectro. A pandemia mostrou como essa mudança é ainda incompleta e frágil, abatendo-se sobre muitas mulheres o fardo da desigualdade pandémica.

E, tal como noutras coisas, também o contributo para a mudança mais radical só é efetivo quando começa pelas nossas escalas de maior proximidade, o respeito infinito pela companheira, o equilíbrio desejável nas tarefas caseiras, a convivência franca, aberta e solidária com as colegas de trabalho, a transmissão desses valores aos mais pequenos que podemos ainda influenciar pelos valores vividos.

Um tributo à Mulher que por essa via pode aspirar a mais altos voos.

 

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