quinta-feira, 21 de julho de 2022

AINDA NOS AÇORES – REENCONTROS E VELHOS AMIGOS …

                                                                                    

(Com voo de regresso pela hora do almoço, erguer matutino e por isso oportunidade de um encontro pós-pandemia com um velho Amigo Açoriano, o Dr. Rui Bettencourt, com quem travei conhecimento na altura em que era Diretor Regional do Emprego e da Qualificação e com o qual mantive longas conversas sobre o tema do ajustamento nos mercados de trabalho e formação, domínio em que é um especialista e fortemente interessado em tudo que pode ser inovação ao serviço de um matching mais eficaz entre oferta de qualificações e procura de competência, tudo em prol de melhores níveis de empregabilidade de jovens e adultos à medida que melhoram a sua qualificação. Atualmente Diretor da Escola de Hotelaria em Ponta Delgada, o Dr. Rui Bettencourt é um entusiasta da prospetiva estratégica, muito próximo de Michel Godet e do Conservatoire des Arts et Métiers e, no âmbito da sua dupla nacionalidade portuguesa e francesa, teve alguns anos na região de Paris a trabalhar nas questões da formação e da prospetiva estratégica com Godet. Temas de conversa não faltavam …)

Numa beira-mar amena de Ponta Delgada, na transição entre S. Roque e a Lagoa, numa praia que recomendo, praia do Pópulo creio que se chama assim, pusemos a conversa em dia, sempre com o tema da prospetiva estratégica e do ajustamento da formação às necessidades das empresas e do mercado de trabalho.

Mas não resisto a reproduzir uma incursão da conversa que começou na minha referência à entrevista de Álamo Oliveira na Grotta que convoquei para o post de ontem. O Dr. Rui Bettencourt é um exímio contador de histórias e trouxe uma deliciosa sobre o escritor Açoriano João de Melo, bem conhecido no continente e atualmente residente em Lisboa. Num dos regressos aos Açores, o escritor acedeu a ceder uma sua casa no Nordeste para renovação e instalação de um museu sobre a sua obra, a cargo da Câmara Municipal do Nordeste e não sei se com algum apoio do Governo Regional. Uns tempos depois, o escritor não resistiu à curiosidade de revisitar a casa. Em conversa posterior com o meu interlocutor de hoje, e mostrando-se um pouco desanimado, o escritor terá contado que, tendo visitado a casa sem se identificar, não resistiu a perguntar à zeladora -rececionista o que era feito do escritor base do museu. Ao que a referida senhora terá respondido … esse já morreu. Não admira por isso que o escritor estivesse algo desanimado, afinal tinha assistido vivo à representação do seu desaparecimento …

Na conversa de hoje, voltámos aos temas de sempre e trouxe muitos elementos interessantes sobre a sua passagem pela região de Paris em termos de trabalhos sobre o ajustamento da formação ao mercado de trabalho. E tive oportunidade de confirmar que em alguns meios académicos franceses existe uma forte reação e também rejeição a estes propósitos de trabalhar o ajustamento para a empregabilidade, trabalhando a formação para uma melhoria de qualificações que possa melhorar esses níveis de empregabilidade. Em meu entender, largamente associado a meios libertários que olham tontamente esses processos como uma invasão da liberdade individual dos jovens. Já não tenho pachorra para os libertários, provavelmente serão os mesmos ou andarão lá perto do que estavam nas barricadas contra as vacinas e vá lá saber-se sobre que mais matérias.

Falou-me o Dr. Rui Bettencourt de uma grande iniciativa na aglomeração metropolitana de Paris sobre um trabalho exercido em torno dos jovens NEET locais, jovens que não estudam, não estão empregados e não se encontram em formação. É um tema constante das preocupações europeias e os Açores também se confrontam com a dimensão do problema. Uma das grandes dificuldades do trabalho com os NEET é a sua identificação e localização, para posterior trabalho de formação de competências e encaminhamento para complementos de educação, formação ou apoio à empregabilidade direta. A iniciativa na aglomeração de Paris envolveu inovadoramente um protocolo de cooperação alargado com diferentes entidades suscetíveis de contactar com jovens e registar (alertando para) situações típicas de NEET e permitir assim o contacto e o trabalho posterior. Subjacente ao trabalho está uma metodologia apuradíssima de registo de competências ou de qualificações em falta que permite, concluído o trabalho de identificação em contacto direto com o jovem, a visualização dos domínios sobre os quais se propõe ao jovem um modelo de encaminhamento. Claro que à escala dos Açores tudo será mais fácil, dada a maior facilidade de identificação das situações.

E esta experiência levou-me a uma ideia pela qual me tenho batido. Defendo que sobretudo a Região Autónoma dos Açores é fortemente penalizada pelo facto de estar dependente dos processos coordenados e conduzidos pelo INE nacional, por exemplo em matéria de definição do insucesso e abandono escolar e de estimação da taxa de pobreza. Ao estar dependente de processos de amostragem definidos a nível nacional, tenho para mim que os Açores podem estar a padecer de uma sobre-representação estatística dos dois fenómenos, exagerando uma dimensão estrutural que existe sem dúvida em confronto com o Continente, mas que pode estar a ser erradamente estimada. Não vejo razões para que os Açores não possam utilizar o seu sistema estatístico regional e construir amostras mais adaptadas à sua fragmentação territorial e tirando partido da sua pequena escala para agilizar os processos de estimação e medida. Não estamos a falar de matérias de somenos importância, pois o insucesso e abandono escolar e a pobreza são indicadores que influenciam bastante a notoriedade internacional.

Com um voo Ryanair para o Porto, atrasado mas em limites decentes, conclui-se esta missão, que me fez rever boas experiências e velhos amigos. A Região vive um novo ciclo político que está longe de estar estabilizado e isso nota-se na administração regional que faz a sua adaptação à alternância democrática.

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