(As vãs e idiotas ideias de regressar à glória do Império que marcaram a campanha para o Brexit esbarraram com estrondo na anquilosada direção dos Trabalhistas a cargo de Corbyn, fossilizado no esquerdismo intervencionista, e na progressiva degradação do poder Conservador, iniciada nos tempos de Cameron e Osborne, continuada agonicamente nos tempos de Theresa May e oficialmente declarada na derrocada pessoal e política de Boris Johnson. A elite britânica que tem passado pelo palco da governação, sobretudo a conservadora, formada nas mais exigentes Escolas, Eaton é o paradigma, cheira a naftalina já fora de prazo, acumula escândalos e comportamentos de degradação moral, ética e humana e, esta última semana, proporcionou-nos imagens inesquecíveis de desvario e desmoronamento. Tenho para mim que, por mais excêntrico e outlyer que a possamos considerar, a personagem Boris Johnson não é mais do que o pináculo de um processo de degradação política, alimentada pela perpetuação do modo de reprodução da elite conservadora, a precisar urgentemente de renovação para a diversidade.)
Bem podemos louvar o sistema parlamentar britânico (estou nesse grupo) e algumas características da sociedade britânica para dourar a pílula da transição pela qual o Reino Unido está a passar. O insuspeito The Economist considerava que o Reino Unido se encontra numa situação de grande perigo, colocava em capa uma cruel imagem da queda de Boris, designando-a de Clownfall (A queda do palhaço) e emitia uma mensagem violenta e assertiva de que ele deveria abandonar funções imediatamente. Ou seja, pelas lentes da rigorosa e liberal revista britânica a coisa está preta para aquelas bandas e, de facto, as abelhas tontas das elites governamentais limitaram-se nos últimos a escrever por baixo, aceitando implicitamente o veredicto da revista: “Embora as impressões digitais de Mr. Johnson estejam por todo o lado na confusão de hoje, os problemas estão muito para além do que um simples homem” (link aqui).
Essa é a verdadeira dimensão do problema. Por mais legitimidade democrática que a solução do BREXIT revelasse, e ela é em si legítima e soberana, a verdade é que não foi preparada, se o foi foi com a barriga dos Conservadores e apoiantes do LEAVE em geral. Hoje, a evidência mostra que a economia britânica vai atravessar uma penosa e longa transição de adaptação a esse contexto do BREXIT.
Irei em próximos posts rever a situação macroeconómica do Reino Unido, porque ela é em si estimulante do ponto de vista analítico, pois trata-se de uma economia com moeda própria e não uma moeda qualquer. Os desequilíbrios fundamentais começam a ser gerados ainda no consulado de Cameron-Osborne, com a mais despropositada política de austeridade que se poderia imaginar à altura, produto daquele espírito de classe favorecida que os “meninos” de Eaton e outras Grandes Escolas ao mínimo pormenor revelam com orgulho e com completo esquecimento do conjunto da sociedade britânica.
Vivemos momentos paradoxais e estranhos. A melhor ilustração dessa evidência é o flagrante contraste entre o modo como os líderes Ucranianos, principalmente Zelensky viveram, com tristeza, a saída de cena de Boris e, simultaneamente, nas ruas de Londres o pessoal vivia com alívio esse abandono. Ao contrário do que o Presidente Marcelo sugeriu, isso não mostra as contradições que hoje em dia a governação interna e externa podem assumir. Mostra antes que Boris Johnson utilizou despudoradamente o apoio entusiástico à Ucrânia como instrumento de prolongamento da sua fixação no cargo de primeiro-Ministro. Aliás, na linha do que tinha sido o tom contraditório das suas opções no passado, europeísta para depois se tornar num Brexiter de ocasião e, mesmo em relação ao Brexit, com posições de contra e a favor em função das suas conveniências.
Ontem, o Guardian publicava um artigo surpreendente e simultaneamente bem ilustrativo da personalidade. Dizia o jornal britânico que alguns dos seus biógrafos identificaram um problema a curto prazo na rocambolesca vida de Boris Johnson. O homem não teria a curto prazo sítio onde dormir e viver, já que esperançado numa longa permanência no poder vendeu a sua casa e o apartamento da sua futura mulher é suficientemente pequeno para não acomodar a nova família. Mesmo pressupondo que o gato Larry ficará em Downing Street, o homem parece estar naquela incómoda situação de “sem abrigo” privilegiado. Como diria o careca, isso talvez explique em termos comezinhos o seu afã em permanecer no poder, diz ele até ser substituído, poderíamos dizer nós até resolver os seus problemas de habitação.
O ar da política internacional está um bocadinho menos tóxico e ser palhaço na política talvez não compense. Johnson está como está e em Itália o 5 Estrelas de Beppe Grilo, outro palhaço, não vive dias melhores.
Os palhaços para o circo, parece ser uma boa palavra de ordem.
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