(Férias Seixo-Caminhenses são um ritual de já há alguns anos, nos últimos tempos ocupando praticamente todo o mês de agosto. A entrada num período de pausa como este tão prolongado gera-me sempre uma transição difícil, na qual nos primeiros dias passo por lagarto, cruzes que credo, eu que sou encarnado dos quatro costados, tentando adaptar-me a um biorritmo diferente, que passa por um erguer mais tardio, sesta se o corpo a pedir e outras excentricidades para um adicto de trabalho, quanto baste. Este ano, para complicar, agosto começará com uma canícula que não é própria destas paragens. Confesso que não sou bicho convicto de praia, frequento-a é certo, moléstias dermatológicas exigem moderação de sol, aguento algumas horas, com cadeira apropriada, de realizador se possível, o caminhar pela beira da água ainda é a melhor maneira de passar o tempo, incursões pelas magníficas ecovias que a Câmara de Caminha construiu, mas tendo a acabar na esplanada mais próxima com uma bebida fresca por companhia…)
Férias é certo, mas ainda com uns pequenos rabos de palha em termos de trabalhos por concluir, com toda a tralha de telecomunicações atrás e na semana que vem com a tentativa, que espero bem-sucedida, de contratualização de fibra, neste caso da Vodafone, para a criação de melhores condições … de trabalho.
Tempos sombrios e mais incertos são o mote do update do World Economic Outlook do FMI em torno do qual organizei o meu último post.
Para esses tempos concorre centralmente o prolongamento da invasão russa da Ucrânia, o qual nos começa a colocar um dilema terrível, de que a decisão última das autoridades ucranianas é parte integrante. O dilema pode ser enunciado nos seguintes termos. Por um lado, parece inequívoco que a condenação da invasão russa deve ser continuada, caso contrário o precedente da impunidade ficaria instalado para sempre na cena mundial, acrescentando a esta uma incerteza estrutural. Mas, por outro lado, é cada vez mais certo, e as diferentes nações ocidentais começam a estar conscientes disso, que a continuação indefinida do conflito sem ensaios e aproximações de negociação diplomática faz disparar as probabilidades de descontrolo da situação e toda a gente sabe o que pode esse descontrolo representar.
Reparem que não introduzo no dilema a questão dos custos de bem-estar que a continuação do conflito coloca ao modo de vida ocidental. Esse é um problema real mas, desculpem-me o atrevimento, é um problema menor face ao coração do dilema. Não é apenas a guerra na Ucrânia que pressiona essas condições de bem-estar. A nossa adaptação ao novo cenário, diria ao novo PRESENTE das mudanças climáticas, dificilmente será consumada sem uma séria adaptação dessas condições de vida material, que demos por garantida e associámos ao vertiginoso ritmo de crescimento da produtividade, até ela mostrar sinais de estancamento. Esse é o aspeto mais “quente” da mitigação das mudanças climáticas. As forças políticas fogem da sua expressão como o diabo foge da cruz, pois pode confundir-se rapidamente com a ideia do “decrescimento económico” e para essa não há marketing político que resista.
Uma grande parte da mudança de comportamentos económicos pode ser acelerada por uma fiscalidade inteligente, mas a mudança de hábitos, de padrões de consumo, de organização da casa e da vida diária, da vida em sociedade dificilmente terá uma fiscalidade a induzir alterações profundas. A perceção individual dos danos civilizacionais da ameaça climática é essencial para gerar a revolução de mentalidades.
Neste campo, esta semana trouxe boas notícias. Finalmente, o recalcitrante congressista Democrata americano Joe Manchin parece que mudou de ideias e que apoiará o plano ambicioso de Joe Biden para afrontar decididamente o tema da mudança climática. Veremos se à última hora o instável político americano não muda de opinião e não compromete de vez a audácia de Biden (que tanto precisa dela).
Por fim na frente diplomática da guerra na Ucrânia, vão ser precisos nervos de aço para acompanhar o desbloqueamento acordado, sob o alto patrocínio da ONU e da Turquia, da exportação de cereais a partir dos portos do Mar Negro. A Rússia é conhecida pelas suas armadilhas táticas no imediatamente após acordos. O ataque observado, pressupostamente dirigido segundo as autoridades russas a instalações militares portuárias, não visava senão em meu entender conduzir as autoridades ucranianas a respostas insensatas que permitissem a Lavrov e seus lacaios o argumento de que os Ucranianos não são gente de confiança. Até hoje, os nervos de aço predominaram sobre as reações imediatas e, à hora em que escrevo, não há evidência segura de que o desbloqueamento não possa ser concretizado.
Este vai ser muito provavelmente o padrão de evolução do conflito. Acordos cirúrgicos ao mesmo tempo que o conflito recrudesce violentamente em algumas parcelas do território até a uma estabilização de forças no terreno em termos de territórios dominados.
Vão ser umas férias estranhas. A andar por aí e sempre atento à mais lúcida imprensa internacional, porque estou cheio de Generais e de Major-Generais debitando sobre tática e estratégia militar e os enviados especiais das nossas televisões ao teatro de guerra captam o pontual e a desgraça, não a interpretação global do conflito. E ontem tivemos a boa notícia de que o Rogeiro e o Milhazes vão para férias. Ufa que alívio.
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