Desde que aconteceram as eleições legislativas, saldadas por uma inesperada maioria absoluta do Partido Socialista (leia-se, de António Costa), que as semanas passam, as notícias aparecem em catadupa e as perceções cidadãs mais atentas vão tendendo a surgir dominadas pela ideia de uma governação desorientada e imobilista, que o mesmo é dizer marcada pelo taticismo de ocasião que vai fazer do atual primeiro-ministro o político democrático português recordista em falta de visão e oportunidades perdidas.
“Expresso” após “Expresso” (e o “Expresso” será o jornal ainda comprado pela maioria dos cidadãos que insistem em se irem guiando pela imprensa escrita, no caso, como alguém disse, um jornal metido dentro de um saco que nem sequer permite que se lhe vejam as gordas), estes quase quatro meses de um Governo Costa em versão três vão sendo explorados de modo pouco dignificante para o seu chefe e senhor, assim consolidando uma opinião fraca (e sobretudo descredibilizante) em relação ao primeiro-ministro, aos seus ajudantes e aos políticos em geral. Ontem, Clara Ferreira Alves ― num texto cheio de hipérboles mas ao mesmo tempo na mouche sobre a ligação Lisboa-Porto em modo Alfa ― descrevia a situação através de uma aflitiva visão de fundo em que o governo marca a sua presença mas a sociedade como um todo é também convocada: “A travessia do país diz-nos o que precisamos saber sobre o que está errado em Portugal. A megalomania, a ganância, o mau gosto e a incapacidade de usar os fundos europeus com competência e discernimento. O desperdício coberto pela manta do (sub)desenvolvimento.” E, no plano do concreto, ela não saberá da missa a metade como eu julgo que vou sabendo por via das informações que me chegam sobre o PRR e o PT 2020, nomeadamente. Neste quadro, a coluna do Diretor João Vieira Pereira (“A bazuca está torta”) volta a ser explosiva: “Onde estão os projetos estruturais portugueses? Digam-me só um. Apenas um que tenha a ambição de transformar Portugal em algo diferente de uma colónia de férias para turistas europeus remediados ou uma casa de repouso de luxo para reformados que não querem pagar impostos nos seus países de origem.”
Assim e dado que tenho AC na melhor das contas nos planos da inteligência em geral e prática em particular, da fixação e foco no trabalho e da proverbial capacidade negocial que já ninguém recusa ser um dos seus dons mais marcantes (excluída a sorte de ter nascido com o traseiro voltado para a Lua), só posso entender aquele triste e medíocre resultado, que parece ir sendo crescentemente consensualizado, através do uso de uma grelha de leitura que lhe é muito própria e mediante a qual a política é assim mesmo (um permanente jogo de inteligência e de pequenas vitórias, se possível com algumas maldadezinhas pelo meio) e uma atividade que tem também de integrar um espaço de confortabilidade para a dimensão pessoal do protagonista principal e da sua lógica e natural ambição de carreira (no caso, a concelebrada ideia de um lugar europeu que AC alegadamente almeja, mais uma vez para nada que não seja a sua ocupação em pleno e com tudo aquilo a que possa ter direito durante um determinado período temporal que é o da sua contemporaneidade objetiva).
Algo descontextualizado talvez, recordo então aquelas palavras que Amália consagrou e aqui caem como uma luva: “Tudo isto existe, tudo isto é triste, tudo isto é fado”. E o facto mais lamentável é que por todas as razões (as “melgas” da “geringonça foram caladas, o temível Rui Rio foi embora, Marcelo está perdido e reduzido ao silêncio possível e o dinheiro europeu é despejado a jorros), e como bem assinalava o Diácono Remédios interpretado por Herman José, “não havia necessidade”...
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