Acompanhei com bastante detalhe as disputas pelo lugar de senador americano nos Estados no tocante às situações mais competitivas da respetiva eleição. E foi já na madrugada de Domingo que emergiu a boa nova de uma vitória altamente renhida dos Democratas em Nevada, a qual se traduziu num impacto determinante para a manutenção do respetivo controlo partidário no Senado.
Com efeito, depois da convicção generalizada em torno de uma anunciada “onda vermelha”, uma luz de esperança tinha chegado da Pensilvânia (onde sucedeu, com um surpreendente John Fetterman ― caricatura acima ― bem coadjuvado pela dupla Biden/Obama, a grande viragem em favor dos Democratas e a grande derrota de um Trump que por lá apostou muita da sua máquina eleitoral), logo de seguida contrariada pela desilusão georgiana (onde a decisão foi mandada para um runoff a acontecer em inícios de dezembro) mas entretanto recuperada pela difícil vitória de Matt Kelly no Arizona, eis que a hipótese de tudo ficar resolvido desde já a favor dos Democratas veio a ser assim materializada através de uma paulatina inversão da tendência inicialmente expressa em Nevada (à medida que se conheciam os votos das maiores urbes, com destaque para Las Vegas) e do desfecho final de uma saborosa consagração tangencial (pouco mais de seis mil votos de diferença) da incumbente Catherine Cortez Masto (aquela que fora, em 2016, a primeira pessoa hispânica a ascender ao Senado). Vejam-se abaixo os grandes números dos Estados em que os Democratas venceram mais apertadamente ou ainda o podem fazer (caso da Georgia).
Obviamente que a mudança do mood eleitoral em variados Estados constituiu, na sua diferença, a grande conquista de todo este complexo processo eleitoral, especialmente ao trazer à tona elementos demonstrativos de uma capacidade de revigoramento da democracia e dos valores americanos de que já muitos começavam a duvidar ― com temas como o do aborto e da segurança (armas) a poderem ter estado na base do repensar das posições expressas por parte das camadas mais jovens dos votantes, junto com uma crescente rejeição do modo como o ex-presidente Trump continua despudoramente a contestar os resultados eleitorais desfavoráveis (acrescida da sempre subliminar lembrança da inqualificável e absurda invasão do Capitólio) no seu estilo insuportável e mais do que grotesco.
Assim, e não iludindo a significância da possível e até provável vitória dos Republicanos na Câmara dos Representantes, o que de mais essencial decorre em termos concretos destas midterms pode ser dividido em duas componentes de idêntico relevo e peso: por um lado, a resultante de uma intocável governabilidade, sendo que esta parecia estar seriamente em risco e ser capaz de conduzir a consequências dramáticas nestes tempos de guerra (como sublinhei no meu post de 8 do corrente); por outro lado, a resultante de um manifesto esvaziamento das proclamadas pretensões de um Trump de peito feito para 2024 (veremos a magnificência do seu prometido anúncio de amanhã), quer por via da sua inevitável perda de influência no seio dos Republicanos (também porque a ele e à sua soberba se podem atribuir algumas das mais humilhantes derrotas sofridas pelo partido do elefante) quer por via do surgimento de uma outra alternativa presidencial republicana forte (o governador da Florida Ron DeSantis, que surge em clara ascensão de popularidade nacional após ter sido reeleito com distinção, alguém bastante menos doente do ego sem prejuízo de ser igualmente populista e piroso qb). Neste quadro, os próximos dois anos serão seguramente emocionantes (o que não significa propriamente interessantes), até porque a experiência e sagacidade de Biden não vão ao ponto de conseguir fazer obscurecer os seus baixos índices de aprovação juntamente com uma falta de carisma e uma perceção de debilidades no plano físico que já ressalta ― ou seja, os Democratas vão estar a braços com uma decisão no fio da navalha entre não diminuírem a autoridade do presidente em exercício numa época em que ela é crucial para o mundo e apresentarem um(a) candidato(a) mais jovem e enérgico como a não completamente revelada Kamala Harris, o ex-presidente Barack Obama ou algum outro personagem do sistema que rompa de entre os complexos, e muito financeiramente determinados, mecanismos que sempre comandam uma tal escolha.
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