(Já há algum tempo que não trazia os escritos de Martin Wolf no Financial Times a este espaço de reflexão. A evolução do pensamento de Wolf é curiosa pois começou por ser um fervoroso apaniguado da globalização para se transformar num dos críticos mais incisivos do atual estado de coisas do capitalismo. No seu último artigo para o Financial Times ele traz-nos elementos de análise que dão que pensar. Justifica-se por isso que retomemos neste espaço a sua inspiração.)
Os dois elementos de análise combinados justificam o título do post de hoje. A globalização tanto pode ser desconcertante nos seus efeitos (por exemplo o tema de reflexão de há poucos dias em que nos últimos 30 anos a desigualdade a nível mundial e a desigualdade país a país não coincidiram nos seus efeitos), como pode ser também um valente desconchavo.
No seu artigo (link aqui), Martin Wolf começa por registar uma regularidade histórica surpreendente: a todos os períodos de aprofundamento e intensificação da globalização sucederam períodos de desglobalização de efeitos por vezes devastadores. Problemas de geopolítica podem adensar a gravidade desses problemas e a natureza de desconchavo afirma-se.
Este é o ponto em que estamos. Estamos num período de sinais de desglobalização, não sabemos ainda se profundamente disruptivos ou se o mundo e os seus governantes serão sábios a ponto de evitar o pior. A história não pode ser interpretada deterministicamente. Mas as regularidades não podem ser ignoradas, avisam, mesmo que tenhamos de estar atentos aos novos contextos.
O segundo elemento, ainda que assente numa correlação que tem de ser olhada com cautela, pois pode não traduzir uma causalidade, sugere-nos um ponto interessante: entre as economias avançadas, os mais abertos ao exterior são os menos desiguais e, em contrapartida, os menos abertos tendem a ser os mais desiguais.
Sinais de desconchavo possível e elementos porventura desconcertantes, que estão em linha com a natureza contraditória da globalização. O que também corrobora a conclusão de parte da literatura da globalização que vê como pouco rigorosa a tentativa de estabelecer uma relação direta entre globalização e desigualdade, sem pelo menos ter em conta a mediação do progresso técnico.
O que aumenta a complexidade da compreensão dos tempos que atravessamos.
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