(Washington Post)
(Com base no Intergovernmental Panel on Climate Change, IPCC, os peritos a ele associados e as Nações Unidas sob cujos auspícios ele funciona lançaram hoje mais um apelo mais ou menos desesperado quanto à incapacidade de cumprir o objetivo de limitar o aquecimento do planeta a 1,5 graus Celsius relativamente às temperaturas pré-industriais. O relatório síntese, o único que está por agora publicado, sintetiza anos de pesquisa sobre as causas e consequências de se atingir um limiar de aquecimento acima do referido objetivo dos 1,5 graus Celsius. Em matéria de investigação não há propriamente nada de novo, apenas a confirmação de um futuro cada vez mais carregado. Não deixei de pensar que temos aqui uma história do Pedro e do Lobo de pernas para o ar. É que, neste caso, o IPCC não faz de garoto travesso a pregar partidas, fala verdade já há muito tempo e as consequências de não se prestar atenção à necessidade de agir em conformidade devem colocar os peritos em transe. E, para mais, os sinais do que reserva a ultrapassagem do limiar dos 1,5 graus são já suficientemente aterradores. Talvez por isso, António Guterres, com tantos problemas para atalhar e dar algum sentido à própria ONU, invocava desesperado a necessidade dos países mais avançados fazerem jus ao nome e avançarem por si sós com a meta de eliminação das emissões até 2040. Recordado ainda do pântano de onde saiu, Guterres não imaginaria ficar no nó do furacão de todos os problemas.
O relatório síntese (1) agora publicado traz evidência inequívoca sobre a incapacidade do mundo escutar os alertas. Desde 1990, data em que os primeiros resultados do IPCC foram publicados, ocorreram mais de 40% do aumento das emissões que ameaçam o não cumprimento da meta dos 1,5 graus Celsius de aquecimento. Cada vez mais se compreende que as causas estão já além da maneira como produzimos ou utilizamos a energia. O nosso modelo de consumo e a maneira desrespeitosa como tratamos a natureza, os ecossistemas e a biodiversidade estão todos interligados, juntando-se à loucura dos sistemas produtivos em termos de emissões e à teimosa manutenção das principais fontes energéticas, carvão, petróleo e gás.
O relatório síntese conserva, porém, uma atitude de esperança ao assinalar aspetos positivos que poderão contribuir para reforçar a mudança de comportamentos e sobretudo de decisões políticas consistentes. É o caso de alguns países em que as energias solar e eólica são já mais baratas do que a energia consumidora de fósseis. É a evidência da redução das emissões entretanto já conseguida sem comprometer o crescimento económico. É ainda a evidência de melhorias sanitárias associadas à qualidade do ar. O ue demonstra a possibilidade de geração de benefícios compensadores dos custos da transição energética e climática.
Pode questionar-se se esta forma de apresentar o problema, aterrorizar primeiro e clamar depois que ainda existe esperança, será a mais adequada para o mundo levar a sério os avisos.
O relatório é, porém, muito convincente quanto às múltiplas oportunidades existentes de escalar o combate à mudança climática.
O diagrama acima constitui um campo de inspiração para as mi ni-intervenções necessárias em diferentes ramos de atividade.
(1) https://www.ipcc.ch/report/sixth-assessment-report-cycle/
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