(Continuo com a reunião de elementos e ideias para a intervenção no Instituto Politécnico de Viseu na próxima segunda feira, 6 de março, em torno do tema da sustentabilidade e da articulação local-global que ele suscita. Designei essa fase de procrastinação, que descreve bem, em meu entender, a metodologia com que, regra geral, preparo estas intervenções. São momentos que utilizo para realizar sínteses de pensamento, revisitar bibliografia que esperava paciente para ser lida e tornada útil, em busca do registo certo e adequado. Ontem terminei a reflexão com a referência ao mistério ou paradoxo do paradoxo técnico, que tem gerado a ideia um pouco frustrante de que o progresso técnico já não é o que era, pelo menos do ponto de vista dos seus reflexos na produtividade e no crescimento económico. Nos anos 70, a economia americana debateu bastante um tema similar. Na altura da generalização dos computadores nas empresas e na vida pessoal, a economia americana vivia um período anómalo de crescimento anémico da produtividade. O grande economista Robert Solow que fez parte da formação de muitos de nós economistas cunhou esse debate com a célebre expressão “os computadores estão por todo o lado menos na produtividade. A pergunta inevitável é esta: mas o que tem que ver essa questão com a da sustentabilidade?)
O primeiro elemento que salta na procura de uma resposta para esta última questão é a forte relevância que as tecnologias digitais assumem na descarbonização da economia e no desenvolvimento da economia circular. Mas essa relevância estende-se a um conjunto muito mais alargado de domínios científicos e tecnológicos. O tema da sustentabilidade ambiental discute, regra geral, em termos separados as questões da economia circular e da descarbonização e transição energética, sem deixar de reconhecer que existem pontes entre dois subgrupos. A Agenda Temática de Investigação e Inovação para a Economia Circular (Fundação Ciência e Tecnologia) (1) constitui um documento público relevante para compreendermos em que medida, a montante da economia circular e creio que o posso estender à descarbonização em geral, existe todo um potencial científico e tecnológico cuja transformação em valor económico é crucial para que a economia portuguesa possa dar um salto em matéria climática e energética.
Trajetórias mais rápidas de valorização económica do conhecimento científico e tecnológico nestas áreas serão essenciais para que a demonstração de novas soluções de sustentabilidade seja mais rápida e convincente e assim aumentar a eficiência dos processos produtivos que pretendem evoluir seja para níveis mais avançados de circularidade, seja na direção de uma economia de mais baixo carbono.
Exemplificando para o tema da energia solar, a evolução em mercado dos níveis de eficiência das células que integram os painéis fotovoltaicos e dos próprios painéis constituirá uma tendência de monitorização fundamental, pois daí resultará a evolução dos preços dos painéis e, por conseguinte, a disponibilização de fontes de energia com menos emissões de carbono e mais baratas.
O economista australiano John Quiggin tem produzido ideias relevantes sobre esta questão da evolução dos preços dos painéis solares em mercado, analisando em pormenor a evolução dos níveis de eficiência das diferentes tecnologias em concorrência aberta para se afirmarem na sua produção e comercialização. Ainda recentemente (2), Quiggin afirmou algum otimismo na evolução dos preços dos painéis a partir de 2023 inclusivé, suscitando que os testes de melhorias de eficiência que têm sido publicados sobre as diferentes tecnologias em corrida concorrencial permitem antecipar substanciais descidas de preços. A eficiência de um painel solar panel é determinada por dois fatores principais: “a eficiência da célula fotovoltaica baseada no design da própria célula e no tipo de silicone e a eficiência total do painel, que depende do layout de células, na configuração e no tipo de painel” (3). Curiosamente, Quiggin não utiliza ou pelo menos não se concentra no termo energias renováveis, defendendo que o fundamental que está implícito na afirmação futura das energias solar e eólica não é o integrarem o grupo das renováveis, mas sim o facto de serem carbono zero. O preço do polysilicon, material essencial para a produção das células dos painéis fotovoltaicos, está em ajustamento descendente, parecendo ter digerido o choque disruptivo de oferta do período pandémico e da invasão russa da Ucrânia.
Aparentemente, ou seja, tanto quanto um leigo nestas matérias o pode antecipar, o progresso técnico necessário à melhoria de eficiência essencial para termos energia cada vez mais descarbonizada parece evoluir a bom ritmo, pelo menos do ponto de vista dos seus reflexos nos preços de mercado. Não tenho conhecimento suficiente para ajuizar se em todos os domínios a montante dos dois grandes subgrupos da sustentabilidade – a economia circular e a descarbonização não existiram processos mais lentos de evolução e de valorização económica do conhecimento. Analisando o problema pelo lado dos resultados da valorização económica do conhecimento, pressinto que na descarbonização a evolução dessa translação tem sido mais rápida do que a observada na economia circular, com exceção neste último caso da área dos resíduos em que me parece que as coisas estão a evoluir mais rapidamente.
(1) former.fct.pt
(2) https://johnquigginblog.substack.com/p/some-hope-on-global-heating?utm_source=substack&utm_medium=email
(2) https://www.cleanenergyreviews.info/blog/most-efficient-solar-panels
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