quarta-feira, 26 de abril de 2023

UMA EVIDÊNCIA CURIOSA

 

                                                                Jonathan Parker

(O sempre inteligente e perspicaz Noah Smith, que bem justifica a assinatura do seu substack, chama-nos a atenção (1) para uma sucessão de tweets de Jonathan Parker, economista do MIT (2)”, que nos oferece relevante informação para compreender o ponto de situação das instituições bancárias nos tempos que correm. A situação é sugestiva e prende-se com algo já aqui abordado neste blogue e que consiste nas consequências negativas das subidas das taxas de juro para o equilíbrio dos balanços das entidades bancárias. O que é importante notar é que o assunto não é apenas macro e, por essa via, aparentemente distante dos nossos problemas quotidianos. A importância da evidência proporcionada por Jonathan Parker é que ela nos ajuda a compreender algo que nos atinge diretamente como depositantes bancários.

 

Já aqui tive a oportunidade de sublinhar que a política monetária restritiva dos bancos centrais para controlar a inflação, baseada na contínua subida das taxas de juro de referência tem que se lhe diga, não apenas do ponto de vista se está em linha com as origens da inflação atual, mas fundamentalmente pelos efeitos colaterais que provoca nos balanços dos bancos.

A explicação é simples, ou pelo menos moderadamente simples. Os bancos têm como atividade principal aceitar depósitos e conceder empréstimos (crédito), mas por razões inerentes à própria atividade bancária cuja explicação transcende o objeto deste post, acabam por deter no seu ativo títulos da mais variada espécie, cujo valor diminui com a subida das taxas de juro. Assim sendo, depois de um longo período de acalmia inflacionária e taxas de juro nulas ou negativas, eis que a política monetária traz todo um outro contexto, perturbando o equilíbrio do balanço. No caso dos bancos americanos de Silicon Valley que entraram em rotura, a situação tornou-se mais grave pois a qualidade e risco de alguns desses ativos era bastante duvidosa e sofreram na sequência dos rumores de problemas de balanço uma massiva retirada de depósitos, afinal aquilo que toda a banca deseja evitar.

Tal como muitos analistas o admitiram, receou-se que o problema aqui mencionado pudesse repetir-se. A intervenção do governo americano e dos reguladores foi no sentido de rapidamente cortar pela raiz os efeitos de pânico e de generalização das retiradas de depósitos. Mas pode perguntar-se por que razão os referidos problemas de balanço não determinaram nos EUA a necessidade de outras intervenções. Na Europa, o Crédit Suisse também não aguentou a pedalada e teve de ser adquirido por outro gigante da banca suiça.

É para esta explicação que o contributo de Parker e Smith é relevante. Como a estrutura do balanço o permite antecipar, ela é ambivalente. Ora, se as subidas das taxas de juro perturbam, por um lado, o equilíbrio do balanço, por outro, essa subida permite aos bancos ganhar com o desfasamento de tempo que existe entre a subida das taxas de juro e a das taxas que remuneram os depósitos. Por mais que imaginemos que os bancos portugueses aumentaram a sua eficiência interna com melhorias de gestão não será por acaso que os seus lucros aumentaram excecionalmente neste período. E embora algumas vozes tenham clamado e com razão que era indecente não repercutir na remuneração dos depósitos a subida das taxas de juro, terão os meus Amigos reparado que o regulador nacional e os bancos centrais em geral disseram alguma coisa sobre essa recomendação, mas muito ao de leve e assim como pedindo por favor que a banca pensasse na remuneração dos depósitos a que aceita?

Porque será?

Parker mostra-o com muita clareza. As subidas das taxas de juro implicam a perda de valor dos ativos bancários, mas, simultaneamente, melhoram as condições do negócio bancário. E, como o Professor do MIT refere, as perdas de valor dos ativos são sensivelmente idênticas às melhorias da sua lucratividade futura, embora tornando a banca menos líquida e sendo obrigados a ganhar de forma mais lenta e a não vender abruptamente ativos.

Em linguagem prosaica, poderíamos inventar um diálogo inventado entre banco central e entidades bancárias: desculpem, meus caros, a subida das taxas de juro, mas para controlar a inflação não temos outro instrumento à mão. Assim, não abusem excessivamente no tempo, mas controlem o problema ajustando mais lentamente a remuneração dos depósitos e não invistam em ativos especulativos e com risco elevado.

Por outras palavras, há sempre um mexilhão que se lixa nestas vagas alteradas e neste caso os depositantes são os carneirinhos a sacrificar. A verdade é que, pelo menos em Portugal, os carneirinhos perceberam que os certificados de aforro eram melhor alternativa, não só em taxas, mas também em risco. E, talvez nos próximos tempos, haja bancos a perguntar ao regulador se a política restritiva vai demorar durante muito mais tempo. Entretanto, obviamente que a torneira do crédito está mais apertada, mas isso corresponde ao que indiretamente o regulador pretendia – resfriar a atividade económica.

Moral da história: os assuntos macro não são sempre etéreos e distantes dos nossos problemas. Este caso mostra precisamente o contrário.

 

(1) https://www.noahpinion.blog/p/four-interesting-econ-stories?utm_source=post-email-title&publication_id=35345&post_id=116988115&isFreemail=false&token=eyJ1c2VyX2lkIjoyMDg5MDk1OCwicG9zdF9pZCI6MTE2OTg4MTE1LCJpYXQiOjE2ODI0MDI3MzksImV4cCI6MTY4NDk5NDczOSwiaXNzIjoicHViLTM1MzQ1Iiwic3ViIjoicG9zdC1yZWFjdGlvbiJ9.aaczYwm8C55JBRhakrXjx718Nuf20cQdgxcKNBeisss&utm_medium=email

(2) https://twitter.com/ProfJAParker/status/1649475613101572098?utm_source=substack&utm_medium=email

 

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