quarta-feira, 19 de abril de 2023

AS METÁFORAS DO ECONOMIST

 

                                                                (The Economist)

(A imaginação jornalística do Economist não tem limites, combinando sempre imagem e texto, e com a projeção de distribuição mundial da revista podemos imaginar que essas metáforas têm de facto o poder de percorrer mundo e influenciar as perceções sobre a economia mundial. A última dessas metáforas merece divulgação, já que ao invocar a Mona Lisa de Da Vinci para descrever a economia mundial de todos os nossos tormentos a imaginação da revista segue caminhos inesperados. O objetivo do post de hoje consiste precisamente em dissecar essa metáfora e a sua razoabilidade.

 

A metáfora reside na espantosa técnica de Leonardo da Vinci que consegue que a nossa visão do rosto de Mona Lisa nunca seja a mesma, funcionando antes pelo contrário como uma permanente reinvenção, que faz daquele objeto pictórico um dos mais fascinantes enigmas da pintura, afinal devido a uma técnica muito especial de um génio.

Na prática, a revista compara a economia mundial de hoje (1) que emergiu após a pandemia, à multiplicidade das perceções sobre o rosto de Mona Lisa. E, de facto, têm-se multiplicado as interpretações sobre o que nos espera em termos de economia mundial. O jornalismo económico pela-se por expressões simbólicas e os economistas seguem-lhe na peugada, atraídos pelo mundo mediático e alguns minutos de fama. Assim, nos últimos tempos, ouvimos expressões como “aterragem suave “(soft landing) que descreve um impacto menor das políticas monetárias restritivas de aumento de taxas de juro que regressaram à prática dos bancos centrais para combater, bem ou mal, veremos, a inflação também ela ressurgida das trevas da pandemia e da guerra. Mas ouvimos também falar de “aterragem forçada” (hard landing) que agrupa os mais pessimistas, constituindo um grupo estranho que reúne os que continuam a defender a expiação punitiva dos desequilíbrios macroeconómicos e os que pensam que a política monetária restritiva irá provocar desnecessariamente uma recessão de grandes proporções. E há os otimistas que defendem que não haverá necessidade por agora de aterragem (no landing), invocando para isso a desaceleração da inflação e o dinamismo da atividade económica posterior à adaptação a um cenário de incerteza e de guerra. E obviamente temos também toda a série de expressões sobre a incerteza radical em que estamos mergulhados, para a qual a teoria económica de “mainstream” não está obviamente preparada, pois navega em mares de informação perfeita, em que atuam navegadores pressupostamente racionais e sempre em condições de otimizar as suas decisões. Claro que num ambiente destes, a sequência de previsões falhadas e sistemáticas revisões dessas previsões é o pão nosso de cada dia e, como o Economist refere, a grande maioria dos inquéritos que alimentam tais previsões experimentou um rombo considerável em termos de participantes, com taxas de resposta em queda brutal, muito provavelmente influenciando também por essa via a volatilidade das previsões.


                                                                 (IMF)

A revista acrescenta um outro fator de perturbação que consiste em reconhecer que os dados objetivos (como por exemplo a taxa de desemprego ou a taxa de emprego) e os dados mais subjetivos que trabalham as expectativas passam por uma fase em que a sus sincronia parece problemática. Os dados mais subjetivos parecem conter mais fortemente sinais recessivos do que os sugeridos pelos dados mais objetivos e essa não sincronia obviamente que complica a vida aos analistas e aos estatísticos que procuram fazer o seu melhor e alimentar bem as previsões.

Mas cá para mim, e é por isso que não me derreto com a metáfora da Mona Lisa, enquanto no fenómeno da perceção sempre em mudança daquele objeto pictórico temos a técnica de um génio a desafiar permanentemente a nossa perceção, na perceção da economia mundial de hoje temos economistas que não são seguramente génios e que por insuficiência de conhecimento ou conhecimento demasiado cristalizado são voláteis interpretando uma situação também marcadamente volátil. E claro que aqueles que no passado poderiam equiparar-se ao génio de Leonardo (e vou dispensar-me de os citar) já não estão cá para o fazer e talvez não tenham deixado discípulos à altura.

(1) https://www.economist.com/finance-and-economics/2023/04/17/how-to-explain-the-puzzle-of-the-world-economy?utm_content=article-link-2&etear=nl_today_2&utm_campaign=r.the-economist-today&utm_medium=email.internal-newsletter.np&utm_source=salesforce-marketing-cloud&utm_term=4%2F17%2F2023&utm_id=1564722

 

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