terça-feira, 11 de abril de 2023

O ABANDALHAMENTO À TONA

Manuel Carvalho está infelizmente de saída da liderança do “Público”, mas enquanto está ainda vai deixando alguns apontamentos preciosos e, sobretudo, patrióticos. Como acontece com o editorial de hoje, de justa dureza para com António Costa mas também com uma porta de esperança entreaberta no sentido de que o primeiro-ministro possa reagir com os mínimos de estadismo que dele se esperavam e a que tanto tem faltado.

 

Sou dos que já descreem na dita capacidade de reação e já aqui me referi a quanto tal me penaliza pessoal e politicamente; porque a leitura que faço, ou fui sendo obrigado a fazer, é a de um personagem político hábil mas incapaz de ver longe e, essencialmente, muito incapaz de se rodear de modo conveniente em termos de competência e ética por gente que lhe puxasse pelos lados bons e o levasse a explorá-los ao serviço do País e do interesse comum. Acho mesmo que a ideia da direção do PS e de Costa de continuar a apostar em que Marcelo está prisioneiro de uma ausência de alternativa por parte da Oposição, ao que acresce o risco de trazer o “Chega” para dentro da esfera governativa, vai acabar por prescrever e dar lugar ao pior. O que já aconteceu junto da maioria dos portugueses que, após uma maioria absoluta de medo (à época de uma junção de Rio e Ventura), a sucessão de trapalhadas e indecências quase infantis que Costa promoveu e patrocinou culminou numa completa indisponibilidade para aturar o estado de miséria moral e política a que “Isto” chegou que tem ficado bem patente no dossiê TAP e em outros que lhe são adjacentes. Sendo que a postura de Costa é fugidia e não frontal, negacionista e não transparente, superficial e não essencial, acobardada e não corajosa, tática e não estratégica, o que só agrava largamente a coisa.

 

Ele bem veio dizer aos portugueses, com um aparente despojamento que só acontece a mando dos seus insensíveis e pouco eficazes marketeers e spin doctors, que esperava que daqui a 30 anos ninguém se lembrasse da sua existência. Mas, na realidade, o que ele arranjou de melhor foi o humilhante “prémio” com que o “Expresso” o brindou ao deixar a interrogação que se impunha: “temos mesmo de esperar 30 anos?”


(Henrique Monteiro, http://henricartoon.blogs.sapo.pt)


Termino com um apelo a António Costa: o de que tenha um assomo de dignidade ― em nome de si próprio e de quanto institucionalmente representa na liderança do Governo e do Partido ― que o conduza a dar a cambalhota a que, perante a degradação e o desgaste de que tem sido o principal responsável, se tem orgulhosamente recusado ― por má análise concreta da situação concreta, por crença otimista na sua boa estrela, por más companhias e mau aconselhamento ou até, também um pouco, pelo fartote que decorre de um compreensível cansaço. E que, para tal, use com a devida ponderação e inteligência os elementos que Ângela Silva identificava no último “Expresso” como sendo os da sua “sorte”, aqueles que segundo a jornalista Marcelo sabe que o primeiro-ministro tem a seu favor: um quadro orçamental extraordinário (verdade, mas uma verdade contingente e a merecer uma abordagem séria e algo despolitizada ― voltarei proximamente a este tópico), o élan económico do turismo (pois, mas...), a “bazuca” europeia que lhe permite injetar dinheiro e lançar obra (pois, mas novamente mas...), uma maioria absoluta (que, pelos vistos, já era), uma oposição com pouco norte (Montenegro não se afirma, de facto, mas Passos está à espreita), um instinto político raro (já comprei mais a veracidade deste argumento) e um clima de contestação que até pode beneficiar o Governo se resvalar para cenas de violência (talvez, mas isso também corresponderia a uma certa morte do artista, ou seja, da estabilidade democrática). Costa disse hoje na Coreia do Sul que retiraria consequências políticas no fim do inquérito parlamentar à TAP que está em curso: se tiver de assim ser, isto é, se tudo ainda tiver de ir piorando por mais algumas semanas até que possa finalmente melhorar, pois que assim seja! Mas que seja!

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