(Sabemos por experiência feita que, em Espanha, tudo é mais excessivo e virulento. Assim, se compararmos os casos e “casinhos” que vieram ao nosso conhecimento do governo de António Costa, agora no limbo da gestão, com o que tem atravessado o governo de Sánchez suportado pela estranha coligação PSOE + SUMAR + Independentistas compreendemos rapidamente essa diferença de intensidade e virulência. O episódio mais recente da corrupção em torno das máscaras Covid teve o condão de amortecer o efeito provocado na sociedade espanhola pela controversa proposta da Lei da Amnistia, objetivamente desenhada para trazer o Junts per Catalunya de Puigdemont à cooperação com o Governo. Claro que no quadro da agitada vida política espanhola, o sistema judicial de topo resolveu entrar na liça e, ao fim de quatro anos, considerar que o movimento catalão Tsunamì concebido para protestar na rua contra a intervenção governamental no procès pode ser considerado terrorista. Mas ainda assim, ou seja, com a lei da Amnistia perturbada por esta possível extensão a atos considerados terroristas, é a corrupção das máscaras que domina por estes dias a vida política em Espanha. Apetece dizer o que é que ainda poderá ensombrar o governo de Sánchez? Tudo lhe acontece. O lençol é cada vez mais curto para as zonas a proteger e, neste caso, a questão está em saber o que é que ficará de fora e desprotegido. Daí eu falar de salvação impossível. Porque, a existir salvação, então Sánchez transformar-se-á num caso de estudo da vida política. E se, por acaso abandonar a vida política, poderá principescamente dar conferências e cursos que poderá lecionar por esse mundo fora sobre a sua resiliência política e as formas concretas que ela assumiu.)
O nome de código que organiza toda a operação judicial em curso é digna de um romance de espionagem – KOLDO. Koldo García Izaguirre é a peça de todo este imbróglio, considerado a mão direita do ex-ministro José Luis Ábalos, que ocupava a pasta dos Transportes, Mobilidad y Agenda Urbana. A trama em análise, que ditou a saída dos cargos do PSOE de Ábalos que, entretanto, ao abrigo dos preceitos constitucionais manteve o lugar de deputado e que não está ainda acusado judicialmente, é complexa e prende-se com contratos de aquisição de máscaras e testes COVID. Envolve relações estranhas entre uma clínica ginecológica Vip em Madrid, muito popular entre o jet set espanhol (a dimensão uterina da política está sempre presente nestas coisas), dirigida pelo ginecologista da mulher de Ábalos, Ignacio Palomo, atinge também a presidente do Congresso de Deputados (Baleares) Armengol que se defende afirmando que a aquisição de serviços de proteção pandémica foi realizada pelos serviços técnicos da Região. Pelo meio, aparecem viagens à República Dominicana e à Guiné Equatorial (que bela decisão foi esta de a envolver nos PALOP), em que Ábalos, já não ministro e apenas deputado, acompanhou Palomo na sua prospeção de mercados para os serviços de proteção oferecidos. Para complicar o processo, a ex-mulher de Ignacio Palomo é atualmente Ministra da Cultura e Turismo do governo Obiang da Guiné Equatorial. Pagamentos estranhos da mulher de Ábalos à sociedade que gere a clínica de Palomo complicam ainda mais a peça, admitindo a investigação em curso que se trata de pagamentos de comissões inerentes ao processo.
Entretanto, sob o fogo cruzado de uma explosiva amnistia e de uma trama de corrupção, o governo de Sánchez nem sequer pode capitalizar o estado avançado da economia espanhola em matéria de crescimento. Em fevereiro de 2024, o número de trabalhadores registados na Segurança Social espanhola aumentou em 104.000 indivíduos, alcançando a massa espantosa de 20,7 milhões de subscritores para a segurança social, recorde mensal desde o ano de 2007.
É verdadeiramente espantosa a resiliência do mercado. Num país político em pantanas, com o PP a aguardar o momento, que tem tardado face à sua vontade, de recuperar o poder, a economia espanhola parece vogar de feição contra tudo e contra todos os incidentes judiciais, incluindo as ameaças independentistas.
Dá que pensar, não?
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