sexta-feira, 22 de março de 2024

AUGUSTO PERDEU MAS JÁ ERA UM VENCEDOR

(Henrique Monteiro, http://henricartoon.blogs.sapo.pt) 

(Luís Afonso, “Bartoon”, https://www.publico.pt) 

Fechadas as contagens de votos dos círculos da Emigração, a principal resultante esteve no afastamento de Augusto Santos Silva (ASS), ex-Presidente da Assembleia da República, do próximo Parlamento. Especulam os comentadores em torno das culpas de ASS neste desenlace, designadamente sublinhando que ele terá sido, no mandato anterior, um alimentador do crescimento do “Chega” (para ajudar a estratégia de Costa de desvalorização do PSD, acrescentam alguns) e se depara agora com uma situação em que o feitiço se vira contra o feiticeiro. A meu ver, os ditos especialistas políticos percebem pouco da poda, visto que o crescimento do “Chega” corresponde, infelizmente, a um fenómeno bem mais estrutural e profundo do que a um hipotético desagrado de centenas de milhar de eleitores para com o modo como ASS por vezes se dirigiu (e bem, digo eu, em nome de mínimos!) a Ventura ou a outro dos seus apaniguados.

Conheço bem ASS e quero aqui deixar explicitado quanto se trata de uma personalidade ímpar em termos cívicos, éticos e intelectuais. Ele será mesmo um dos raros intelectuais que existem na nossa pobre praça pública, além de ter sido um servidor público exemplar no exercício de funções ministeriais muito diversas e prolongadas, além das académicas. Nesse sentido, as acusações a ASS soam a injustas e mais o soam ainda por virem sobretudo de gente relativamente inculta e mal preparada.
 
Dito isto, que é o essencial, não quero deixar de admitir que ASS também cometeu erros. Erros por ter recorrido a desnecessárias provocações políticas (não contra o “Chega” mas nos tempos em que se manifestou favor de “malhar na Direita” e semelhantes), erros de avaliação pessoal (na linha do “pode alguém ser quem não é” que o fez acreditar que conseguiria candidatar-se à Presidência da República sem aquilatar devidamente as suas condições para tal, leia-se desvalorizando a sua visível falta de carisma ou química) e erros associados a tentativas de correr contra o vento (representando papéis demasiado afastados da zona de conforto das suas caraterísticas intrínsecas, entre cedências a assessores apressados a influenciar exercícios manifestamente artificiais de procura de popularidade e uma presença por vezes interpretada como arrogante/vaidosa ao comando do perigoso Palácio das Necessidades).
 
Em síntese: por muito que, aqui e ali, ASS tenha pecado, tais pecados não passaram de veniais e conjunturalmente determinados; não confundamos alhos com bugalhos (como o fazem os dois cartuns acima, o segundo com alguma graça) porque, em real substância, ASS é um cidadão notável a quem o País deve serviços inestimáveis e que merece o nosso aplauso e a nossa gratidão.

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