segunda-feira, 21 de maio de 2018

GONZÁLEZ LAXE PENSA BEM. OUÇAM-NO!



(Tenho boas recordações de conversas e discussões com amigos galegos, realizadas no quadro dos trabalhos de cooperação inter-regional e transfronteiriça. Entre esses amigos,.o Professor Fernando González Laxe, que foi presidente da Xunta de Galicia, teve sempre para mim o reconhecimento de alguém que pensa muito bem. A sua mais recente crónica na Voz de Galicia vai nessa linha, ajudando-nos a pensar a política na era da cultura efémera do Facebook).

Já repetidas vezes recordei neste espaço como foram para mim importantes (e ainda o são apesar de passar por uma fase menos intensa) os trabalhos de cooperação em que tenho participado com universitários e planeadores galegos. As intermináveis charlas e discussões com Anxel Viña (Oficina de Planeamiento) e o saudoso e já desaparecido Juan Dalda (Oficina e urbanista na Universidade da Corunha vêm-me à cabeça. O contacto com quadros da Xunta de Galicia desde os trabalhos preparatórios da cooperação Galiza-Norte de Portugal permitiu-me compreender por dentro a formação de uma autonomia regional. A participação em conferências e seminários conduziu-me ao conhecimento das universidades galegas e a gente com quem interagi em diferentes trabalhos e oportunidades como Sequeiros Tizón na Universidade da Corunha, Alberto Mejido de Santiago de Compostela, o próprio Emílio Pérez Touriño que haveria de ser Presidente da Xunta num governo PSOE-Bloco Nacionalista Galego que haveria de correr mal, Luiz Dominguez Castro da Universidade de Vigo e diretor do Centro Jean Monnet daquela universidade, Xulio Pardellas da mesma universidade de Vigo e tantos mais. E finalmente a dinâmica do próprio Eixo Atlântico a cuja atividade e programação estou irremediavelmente ligado desde os tempos de Fernando Gomes na Câmara do Porto, há já alguns anos sob a batuta do seu Secretário Geral Xoan Mao, um dos mais combativos defensores da cooperação transfronteiriça.

Foi no âmbito dos trabalhos do Eixo que conheci Fernando González Laxe, um professor de economia estrutural com a herança intelectual de Ramón Tamanes e especialista na economia do Mar, já depois da sua passagem pela Presidência da Xunta de Galicia. Não era difícil perceber a sensibilidade política de Laxe, numa linha que me agradava de economia política, um estudioso da mudança estrutural de economias periféricas como a galega. A sua crónica recente na Voz de Galicia trouxe-me recordações da sua finura de pensamento, desta vez interessado nas consequências e malefícios da efemeridade da cultura Facebook sobre a ação política. O PSOE galego está neste momento esfrangalhado mostrando que não soube capitalizar gente e pensamento como o de Laxe, numa incapacidade de transição virtuosa entre gerações. Essa incapacidade atirou os mais experientes e capazes para uma certa distância e cavou a precipitação dos mais novos, ainda por cima estimulada pela instabilidade da direção política nacional.

Laxe chama a atenção para o vazio de conteúdos daquela cultura, em que a argumentação dá lugar tragicamente ao domínio dos vocábulos, atomizados, que acionados dão a ideia de um conhecimento dos temas que é de plástico ou de substância ainda mais horrorosa.

Um economista estrutural com sensibilidade política acabaria inevitavelmente por vir a terreiro defender contra a cultura do efémero a virtude de conceitos como o de cidadania e de direitos sociais. DE vez em quando, é necessário o regresso aos “basics” e quando alguém consistente como González Laxe o faz é sinal de que a esperança está viva apesar da experiência.


Traduzido em termos políticos, o raciocínio pode ser ampliado. Em primeiro lugar, existe uma crise de legitimidade dos projetos ideológicos, devido à atomização das ideias comuns, propiciando a criação de múltiplas agendas (uma para cada tema) com o que podemos perder a perspetiva e, em segundo lugar, as elites políticas refugiaram-se nos seus mundos, conseguindo que o grande conjunto da sociedade sinta que não é capaz nem de controlar nem de desenhar o seu próprio destino. Perante este vazio, coberto de maneira imediata pelos influenciadores e pelos agentes digitais, os que usam tanto as práticas evangelizadoras como os defensores do novo populismo, podem fazer sobressair os seus postulados, motivações e aspirações. Caminhamos, pois, perante um mundo líquido, órfãos de princípios e de valores, sem mecanismos de controlo ético.
Daí a necessidade de voltar a redescobrir as virtudes de conceitos como o de cidadania e dos direitos sociais. Devemos evitar a crise de falta de imaginação e de ambições cidadãs. Não nos devemos converter em aglutinadores de uma coligação de elites.” (Voz de Galicia, excerto de Un proyecto político común - link aqui)

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