(A relação do país com o pensamento da OCDE tem algo de esquizoide,
umas vezes associando-o a um paradigma indesejável, outras parecendo seguir
religiosamente as suas recomendações. Seja ou não porque o
pensamento OCDE é ele próprio contraditório, talvez fosse mais sensato
construir uma perspetiva de país e defendê-la contra generalizações de
pacotilha.)
A convite da
Secretaria de Estado do Emprego e do Ministro da Educação estarei na próxima
sexta-feira, 4 de maio, no Teatro Thalia em Lisboa, numa sessão promovida pelo
Governo para apresentação e discussão do trabalho Skills Strategy Portugal iniciado em 2015 e dando agora origem a um
conjunto de recomendações centradas no ensino de adultos. Solicitam-me um
comentário ao referido estudo, para um programa que hoje dia 1 de maio não
estava ainda devidamente publicitado, o que não me deixa de espantar.
Curiosamente
e pura coincidência, o professor David Justino, hoje vice-presidente do PSD,
personalidade que prezo na sua qualidade de pensador da educação, independentemente
do seu posicionamento político, considera provocatoriamente hoje no Público (link aqui) que a colagem do
governo atual ao pensamento OCDE representa uma forma de regresso ao pensamento
e orientação de Ana Benavente, em contradição com orientações do próprio
Partido Socialista que se tinham distanciado das posições da sua militante.
Essa questão
da colagem do governo ao pensamento OCDE em matéria de educação (e talvez também
em matéria de investigação científica e ensino superior) fica para um outro
post, já que merece autonomia de abordagem.
Para já
interessa-me trabalhar as implicações que a abordagem da OCDE em termos de
competências (skills) determina, tema
que não tem sido suficientemente debatido em Portugal, dada a ligeireza com que
o conceito de competência é regra geral tratado. Regra geral, está mais
assimilada a utilização do conceito de competências no chamado ensino
profissional (o VET – Vocational Education
Training) e bastante menos a sua aplicação mais geral a todo o sistema
educativo, básico, secundário e superior, universitário ou politécnico. No âmbito
deste post, fica o registo da falta
desse debate e aprofundamento, sendo escassa a reflexão sobre a diferença entre
qualificações e competências, tendo presente que estas últimas são indissociáveis
de um contexto de trabalho, o que por si só anuncia a controvérsia da sua
utilização.
Na abordagem
OCDE, aplicada obviamente a Portugal, destacam-se três níveis de análise, cuja
interação é regra geral muito rica: (i) o desenvolvimento de competências da
infância à idade adulta; (ii) a ativação dessas competências no mercado de
trabalho; (iii) a eficaz utilização dessas competências na economia e na
sociedade, que remete para as condições da sua absorção. As questões da
governação e do financiamento completam o quadro proposto.
Se abstrairmos
por agora da controvérsia sobre a abordagem das competências, este quadro analítico
se corretamente aplicado é virtuoso. Por corretamente aplicado entendemos
sobretudo a sua leitura dinâmica, designadamente a questão da interação entre
aqueles três níveis de análise.
A estratégia
proposta pela OCDE para Portugal não é propriamente um monumento de inovação e
criatividade. A estratégia declina-se pelos níveis de análise atrás referidos.
Assim, no
plano do desenvolvimento das competências, propõe-se (i) a melhoria da
qualidade e equidade na educação); (ii) o reforço da adaptação do VET ao
mercado de trabalho; (iii) a aposta nos cidadãos pouco escolarizados através da
educação de adultos e a aprendizagem ao longo da vida. Em matéria de ativação
da oferta de competências, propõe-se (iv) a redução do desemprego jovem e dos
NEET, (v) a intensificação da reintegração de desempregados de longa duração e
(vI) a redução dos obstáculos ao emprego. No plano da utilização eficaz de
competências, propõe-se (vii) o empreendedorismo (também tu OCDE???), (viii) a promoção
da inovação e do emprego altamente qualificado e (ix) a criação de incentivos
aos empregadores para o envolvimento na formação de competências. Nas condições
de governação e financiamento, destaco (x) o financiamento de um sistema de
competências mais equitativo e eficaz, (xi) a adaptação às necessidades locais
e (xii) a capacitação e a formação de parcerias para uma política de competências
baseada na avaliação.
A estratégia
proposta tem de tudo; o óbvio, algum “wishful
thinking”, alguma intuição dos verdadeiros problemas, mas sobretudo por
vezes insuficiente atenção às situações de partida e por conseguinte às estratégias
de transição que é necessário implementar para se chegar aos fins pretendidos.
O retorno à
educação de adultos como prioridade parece-me sensato e prioritário e por isso
será o tema do meu próximo post.
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