quarta-feira, 2 de maio de 2018

UM ELETRIZANTE SACO AZUL?

(Henrique Monteiro, http://henricartoon.blogs.sapo.pt)


Seguramente que nunca se escreverá, em toda a sua real expressão, a história da passagem de Manuel Pinho pelo Ministério da Economia e da Inovação ao tempo do Governo maioritário do PS encabeçado por José Sócrates. O dito aproximou-se do PS ainda durante a liderança de Ferro Rodrigues, participando nomeadamente numas reuniões programáticas que tinham lugar no Hotel da Lapa sob o marcante impulso de João Cravinho. Lembro-me bem do entusiasmo quase politicamente pueril com que Pinho então contrapunha a ideia de um “choque tecnológico” à de um “choque fiscal”, preferida pelo PSD. Com a demissão de Ferro e a chegada de Sócrates, Pinho vendeu bem a sua ideia ao novo secretário-geral e futuro primeiro-ministro absoluto, ainda que não tenha sido suficientemente convincente para lhe arrancar o mais desejado lugar de ministro das Finanças. O exercício de Pinho na Horta Seca foi um second best polémico a vários títulos, sobretudo pelo excesso de marketing a que se quis prestar (quem não se lembra dos enormes cartazes sobre um país campeão do mundo em crescimento das energias renováveis, das pressões em favor de um novo Museu dos Coches, da demolição da casa onde viveu Almeida Garrett, da paixão pela fotografia entre o colecionismo e as paredes do Palácio do Manteigueiro ou do risível episódio da partilha da piscina de um hotel algarvio com Michael Phelps?).

Depois do que há dias veio a público acerca de uma alegada e prolongada avença de Pinho junto do BES/GES, já aparece hoje muito quem diga ou deixe subentender – com ou sem o necessário conhecimento de causa? – que, por detrás de toda aquela cortina, havia uma agenda ou até várias mais ou menos referenciáveis aos interesses de Ricardo Salgado. Além da aceleração de vários projetos da área do turismo, terá sido a área da energia, que também esteve sob a sua tutela (com a ajuda nem sempre bem entrosada de António Castro Guerra), aquela em que mais teve meios para influenciar, quer deixando marcas quer fazendo mossas – a propósito, e numa perspetiva bem mais abrangente, veja-se abaixo a excelente e rememoriante infografia hoje publicada pelo “Público” sobre a novela e o novelo EDP dos últimos vinte anos.

Em qualquer caso, não sei opinar com propriedade sobre o assunto em referência, nem tal verdadeiramente me importa fazer. O que antes prefiro relevar, isso sim, é a falta de toda uma outra discussão e ação em torno das formas de acesso à política, da indevida legitimação de uma supremacia partidária (com os partidos a serem tal qual são, máquinas de empregos e carreirismos fáceis) e/ou do injustificado endeusamento dos chamados “independentes”, da demagogia cínica e populista em torno das remunerações dos políticos, da impreparação substantiva e moral de um número crescente de titulares de cargos públicos, da aflitiva ausência de regras firmes na matéria e em todo o seu entorno (para quando o regresso de uma Administração Pública estável e de serviço e o seu imprescindível fortalecimento em termos escolares e formativos?) e por aí fora num corrupio de temas tanto mais pertinentes quanto mais transformados em tabus da sociedade portuguesa.

No entanto, ao invés do que seria desejável e depois de um ruidoso silêncio vindo de todas as áreas partidárias, o que parece estar agora a preparar-se é mais um momento de desconjuntada chicana política. Por entre o moralismo renascido de Rui Rio, o discutível sentido de oportunidade do Bloco e alguma passividade e seguidismo do PS, apenas sobressai como positiva a perspetiva fria e objetiva e sempre mais politicamente orientada de um PCP que prefere não alinhar em processos improcedentes de animação da malta sob os altos patrocínios da SIC e da TVI e a rasteira chancela casuística do “Correio da Manhã”. A ver vamos...

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