(Já o escrevi e insisto na ideia. Nos casos Sócrates-Manuel
Pinho, qualquer que seja o desfecho jurídico dos mesmos, o que me interessa é a
relação do caso com o modelo económico que se intensificou a partir da segunda
metade do primeiro governo de Sócrates. Quando precisaria de focar
noutras prioridades, o PS está obrigado a uma gestão complexa das sequelas de não
ter em devido tempo analisado criticamente esse modelo …)
A nova
liderança do PSD tem nas suas mãos obrigar ou não o PS a uma gestão mais difícil
do tempo político que mediará até ao fim natural ou antecipado desta
legislatura. Não é ainda totalmente claro se Rui Rio cederá à sede de cavalgar
a toda a brida o impacto dos casos Sócrates e Manuel Pinho que algum PSD mais vingativo
manifesta sem pudor. Mas ceda ou não, o que parece evidente é que António Costa
não contaria ter de fazer este “desvio produtivo” para tentar atalhar as
sequelas de uma digestão mal feita do modelo económico para o qual a governação
de Sócrates evoluiu a partir do êxito de algumas das suas realizações. O PS precisaria
de estar focado noutras matérias, a complexa negociação do orçamento de 2019 e
a preparação à prova de fogo do verão nas florestas e vê-se obrigado a este desvio,
destinado a conter os prejuízos eleitorais que os atuais desenvolvimentos dos
casos acima mencionados estão a provocar.
De que
modelo económico estou a falar?
Num quadro
de alocação de recursos tendencialmente comandada pela interação dinâmica entre
modernização de infraestruturas e valorização do imobiliário, favorecida por um
incremento significativo do endividamento público, o modelo tendeu a evoluir para
um intervencionismo económico, alimentado sobretudo pela criação ou favorecimento
de empresas bandeiras do regime. PT, EDP, GALP e as teias do seu relacionamento
com o sistema financeiro eram apresentadas como alimentando a ilusão da criação
de empresas globais. Esta criação seria apresentada como a demonstração de que
Portugal não desdenhava jogar o jogo da economia global, afinal um país de dimensão
reduzida orgulhar-se-ia de patrocinar empresas globais, de raiz nacional,
completando a presença de outras empresas globais induzidas pelo investimento direto
estrangeiro, que haveria nesse período de contraditoriamente reduzir-se e de se
circunscrever, perigosamente, aos setores imobiliário e financeiro,
dominantemente não transacionáveis.
Como regra
geral acontece nestes modelos de alocação de recursos, ninguém se preocupa com
os sinais que tal modelo está a oferecer ao investimento em geral, evidenciando
padrões de lucratividade que a luta insana no mundo dos transacionáveis não
seria capaz de proporcionar.
E, mais do
que isso, numa economia de pequena dimensão como a nossa, apostas dessa
natureza no sentido de favorecer pretensas empresas (grupos) globais, mesmo que
não se traduza em volumosa magnitude de investimento público, acabam por abafar
toda a economia e condicionar a política pública. É óbvio que, por exemplo no
caso da PT, se admitia que essa empresa global ajudaria a traçar uma trajetória
tecnológica capaz de valorizar o conhecimento científico e tecnológico que o país
começava a evidenciar nesta área (a PT Inovação e outras massas críticas nas
universidades do Porto e de Lisboa), gerando ainda complementaridades com os recursos
nacionais em termos de sistemas de informação e TIC em geral. No caso da EDP,
era a aposta nas renováveis (sempre sem avaliar o retorno do forte peso da
subsidiação pública) que se desenhava, anunciando também uma trajetória tecnológica
nessa área, reforçada depois com a fileira das viaturas elétricas.
Nunca ninguém
se preocupou em demasia com as interações deste modelo com o tecido generalizado
de PME que caracteriza a nossa base produtiva. Valia então a ideia peregrina do
“trickle down” das apostas globais,
sugerindo alguns, timidamente, de dedo pouco espetado no ar, que algo de
semelhante às complementaridades da Auto Europa com a subcontratação nacional poderia
emergir. Na frente internacional, deste modelo, reduzida, rapidamente se começou
a perceber que destinos de aposta como a Venezuela, o Brasil ou Angola eram
apostas demasiado frágeis e não estimuladoras de uma estratégia exigente em termos
de inovação tecnológica.
Num país de
dimensão reduzida, este tipo de intervencionismo económico é fácil e
rapidamente capturado. Essa captura é demasiado sedutora para agentes políticos
que se inebriem facilmente com o protagonismo do apoio público e a sua venalidade.,
como parece ter sido o caso, entre quem apoia e é apoiado.
Não é este o
modelo que Mariana Mazzucato enobrece no seu Entrepreneurial State.
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