(Dias de primavera exultante em Seixas, tempo ideal para a
entrevista de Habermas ao El País semanal, a lucidez aos 89 anos, hoje
já longe do bulício e da cacofonia dos grandes encontros, mas com a frescura de
pensamento que é conhecida.)
Fim de
semana de primavera exultante em Seixas, excelente para recarregar baterias, com
leituras dispersas, os carvalhos no máximo do verde (mau agoiro desportivo) e
recordações pelas estantes do marxismo, sucedâneo singelo de comemoração de 200
anos do nascimento de Marx.
Entre tais
leituras dispersas, a entrevista de Jürgen Habermas ao El País semanal na intimidade
da sua casa no Lago de Stanberg a 50 quilómetros de Munique (link aqui) é um excelente
documento, revelador das suas preocupações contemporâneas. Habermas é talvez o último
grande intelectual vivo de acordo com o entendimento que os franceses tendem a
dar à figura, embora considere que se trate pelos tempos próximos de uma espécie
em vias de extinção. Não porque não existissem candidatos potenciais a esse
exercício, mas apenas porque os leitores que poderiam ser recetivos aos
argumentos dos “intelectuais” estão esses sim em desaparecimento total. Afinal,
um reflexo da deterioração da esfera pública em que tal figura se poderia movimentar.
O espaço que lhe está reservado na comunicação social é ridículo. Os comentadores
são palradores estimulados pelo critério formal do simples confronto dos opostos,
sem que se pretenda qualquer aprofundamento dos argumentos e formação consiste
de opinião pública informada. Habermas designa de mercantilização da atenção pública
todo esse processo de deterioração, hoje chegada ao extremo da exploração económica
do perfil dos utilizadores da rede. A internet é uma realidade contraditória,
desde a possibilidade da aceleração do conhecimento científico à mais
despudorada invasão e aproveitamento de dados de utilização, não sendo de todo
impossível que algum dia possa emergir um modo civilização de manejamento das
redes sociais.
Retenho da
entrevista duas outras ideias sobre temas que têm passado por este blogue.
Sobre a
questão catalã, Habermas disse: “Mas realmente
por que razão um povo culto e civilizado como a Catalunha deseja estar só na Europa?
Não compreendo. Dá-me a sensação de que tudo se reduz a questões económicas. Não
sei o que vai acontecer. O que pensa o senhor?”
Sobre Macron
e perante a pergunta do jornalista que o designa de filósofo-presidente,
Habermas é contundente: “Por Deus, nada de
governantes filósofos! Não obstante, Macron inspira-me respeito porque, na cena
política atual, é o único que se atreve a ter uma perspetiva política; que,
como pessoa intelectual e orador convincente, persegue as metas políticas certas
para a Europa; que nas circunstâncias quase desesperadas da disputa eleitoral,
demonstrou valor pessoal e que, até agora, desde o seu cargo de presidente, faz
o que diz que iria fazer. E numa época de uma perda paralisante de identidade
política, aprendi a apreciar estas qualidades pessoais face às minhas convicções
marxistas.”
De quando em
vez, sabe bem perceber que não estamos a pensar desajeitadamente e a primavera
finalmente exultante ajuda.
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