domingo, 10 de janeiro de 2021

FIM DOS DEBATES


Terminaram ontem os debates presidenciais para que hoje se inicie uma campanha eleitoral atípica e predominantemente virtual. Os ditos debates foram, na generalidade e além de largamente previsíveis, desinteressantes e, por vezes, nada edificantes. Do que vi e de como vi, faço a seguinte síntese (tão objetivamente quanto sou em esforço capaz de o fazer): Tiago Mayan foi talvez a maior surpresa positiva (ainda que dentro de um discurso inconsequente por inaplicável); Ana Gomes foi uma boa surpresa (até por ter logrado, o que não parecia fácil, sair da sua zona de conforto discursivo); Marcelo foi igual a si próprio no cumprimento decente de um calendário obrigatório (experiência, uma cabeça arrumada e alguns fogachos de inteligência, representando uma direita social que é cada vez mais necessária mas ganharia se ostentasse mais visão e menos tática); João Ferreira foi o candidato neutro que se esperava (totalmente consagrado à defesa do espaço de voto que ainda vai sendo detido pelo seu partido); Marisa Matias foi uma surpresa negativa (qual PCP, refém de uma lógica estrita de defesa do campo bloquista, com a agravante de o vir fazer num momento pós-geringonça e de chumbo orçamental que visivelmente ressaltava como inadequado para o efeito); André Ventura foi a maior surpresa negativa (digam as redes sociais o que disserem, este seu “herói” evidenciou com clareza a superficialidade, a inconsistência e a má-criação que o caraterizam, tendo a meu ver perdido todos os debates em que participou). Considero ainda que os debates mais interessantes, e onde houve laivos de alguma qualidade política, foram aqueles em que se defrontaram as direitas (Marcelo-Mayan, Marcelo-Ventura e Mayan-Ventura) e o debate pela disputa da “medalha de prata” entre Ana Gomes e Ventura; em contraponto, foram quase inexistentes os debates protagonizados por Marisa (sobretudo com Marcelo e Ferreira).


Quanto a expetativas de resultado, e sendo óbvio que ninguém desmentirá o incontornável favoritismo de Marcelo (média de 60,3% nas três últimas sondagens divulgadas – Eurosondagem, Aximagem e Intercampus), nesta eleição a grande vencedora será seguramente a abstenção (votarão menos de 40% dos eleitores inscritos). Daí que a única verdadeira questão que se colocará no dia 24 é a que tem a ver com o segundo lugar e a ameaça de Ventura lá chegar (o que me parece longe de estar excluído) – por isso tenho dificuldade em entender posicionamentos não partidários (leia-se, de quem não seja militante comunista e bloquista ou seus próximos) que optem por um Marcelo que é vencedor certo em detrimento de uma Ana Gomes que é a democrata em melhores condições (média de 13,2% nas ditas três sondagens, contra os 6,2% de Marisa e os 5,7% de Ferreira) de parar um Ventura com 9,2% expressos e, provavelmente portanto, algo mais de facto (o pudor e a vergonha ainda imperam nos respondentes às inquirições das sondagens). E assim sendo, veja-se neste argumentário um apelo mais sistemicamente determinado do que assente numa consciencializada escolha pessoal.

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