(Financial Times)
(Os mais assanhados defensores do BREXIT nunca, compreensivelmente, poderiam imaginar que o impacto concreto da sua decisão os apanhasse no meio de uma pandemia de dimensão devastadora. Sabemos que entre as impensadas palavras de ordem que mobilizaram parte do eleitorado do LEAVE THE EU, designadamente classe trabalhadora ligada ao LABOUR, estava a da recuperação do emprego para os britânicos. A trágica combinação de BREXIT + Pandemia está a fazer-lhes a vontade.)
Já por repetidas vezes chamei a atenção neste blogue para o caráter não fundamentado do pérfido argumento segundo o qual os BREXITERS instalaram na população britânica mais sedenta do poder imperial de outros tempos a ideia da ameaça da invasão externa potenciada pela integração na União. Bastam uns dedos de conversa com alguém que tenha trabalhado no Reino Unido para perceber que a oferta de qualificações médias e superiores no Reino Unido teve um elevado contributo para estimular o recrutamento de população jovem estrangeira. Se essa população chegou e teve emprego aos salários correntes isso significa apenas que a oferta de qualificações não alimentou o mercado de trabalho e que as empresas que recrutaram viu algum interesse objetivo nessa contratação. A tal invasão de que os BREXITERS tanto falaram deveu-se essencialmente a uma mudança da formação média e superior que tendeu a privilegiar os setores mais intensivos em conhecimento. Os jovens que chegaram responderam a uma falha de mercado e às gigantescas atividades de organização de mão de obra externa em que a sociedade britânica se especializou, alguma das quais por vezes pouco recomendáveis. Conheço alguns casos desse tipo como por exemplo no domínio dos quadros técnicos de suporte a atividades como a veterinária para matadouros e outras infraestruturas do género.
Estou convencido que essa sociedade britânica recetiva a esses argumentos de exploração da xenofobia e da perceção da ameaça do outro não compreendeu como o mercado de trabalho britânico pode passar por longos períodos de “matching” deficiente entre procura de qualificações e uma diminuída oferta nacional.
Ninguém imaginaria que a essa insensata perceção do mercado de trabalho britânico se iria juntar a devastação de uma pandemia. Já ouvi gente a falar pela primeira vez que me recorde de que o Reino Unido pode ser um Estado falhado. E já não falo no que pode acontecer com a tendências de desagregação do reino, com a tensão provocada pela aspiração da Escócia a permanecer na União Europeia e com a questão das Irlandas.
Ora, a tomar em devida conta os dados que o Financial Times acaba de publicar (link aqui), a combinação entre a curto prazo a pandemia e a crise económica por ela gerada e a antecipação das condições reais do BREXIT terá já determinado o êxodo de cerca 1 milhão e trezentos mil ativos. Várias razões terão determinado essa decisão mas arriscaria a dizer que a maior dificuldade de população estrangeira aceder às medidas sociais de compensação pelo encerramento de atividade estará entre os fatores determinantes daquele êxodo.
O gráfico do Financial Times que abre este post mostra como naturalmente a grande aglomeração de Londres é a que representa a maior origem do êxodo observado. O Reino Unido está territorialmente “inclinado” para sul dada a enormidade da concentração registada na região de Londres. Não espanta por isso que a destruição de expectativas aconteça também maioritariamente nessa região. Os números apresentados pelo FT incorporam apenas dados até setembro em comparação com período homólogo em 2019, pelo que se pode antecipar que a degradação da situação até ao Natal tenha intensificado o referido êxodo.
Surpreendentemente ou talvez não, a Escócia é a única região do Reino Unido que não evidencia a saída de população estrangeira.
Se esmiuçássemos os números do gráfico do Financial Times por região compreenderíamos que noutros territórios são outras atividades também afetadas pela crise sanitária a gerar o êxodo de população estrangeira.
(Financial Times)
O gráfico acima mostra idêntica realidade em relação ao emprego detido por população estrangeira, com a vantagem de identificar os ramos de atividade económica em perda. Sem surpresa, o retalho comercial, a indústria transformadora e a hotelaria e alojamento dominam as perdas de emprego nessa população, mas está longe de se limitar a esse trio.
O que me parece existir aqui é um duplo efeito que vai agravar a perda económica do Reino Unido nesta situação. Para além da crise económica determinada pela devastação pandémica e pela necessidade de confinamentos de grau máximo, a economia inglesa vai passar por uma quebra que pode ser substancial de produto potencial. Muita dessa população que agora sai pode certamente regressar. Mas nestes processos os ajustamentos de mercado de trabalho e de produto potencial não acontecem como nos manuais dos ajustamentos sem tempo. Levam tempo e esse é espesso e tem duração.
Talvez a combinação explosiva BREXIT + pandemia provoque mais rapidamente e com mais intensidade o choque com a dura realidade e não com os inflamados argumentos do LEAVE.
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