A conjuntura política europeia neste pós-Verão de 2021 está em manifesta aceleração nos grandes países do Velho Continente. Primeiro será a Alemanha, onde a saída de Merkel (geschafft, i.e., feito, parece uma boa síntese, talvez até ligeiramente insuficiente perante a amplitude dos problemas que se lhe depararam e das soluções moderadas que patrocinou) vai dar lugar a mudanças ainda imprevisíveis mas apontando previsivelmente para uma coligação liderada pelos social-democratas (com o atual ministro das Finanças, Olaf Scholz, ao comando — embora seja muito curioso que o reputado comentador Wolfgang Münchau tenha esta semana assinado um artigo intitulado “Cuidado com Olaf Scholz”, onde sustenta que ele esteve “no centro de todas as más decisões que associamos com a política económica do seu país nos últimos 20 anos”) e mesmo para a possibilidade de um afastamento da CDU do poder (tornando evidente a desastrosa escolha de Armin Laschet e algum azar que sobre ele se abateu por via das brutais inundações que afetaram o estado de que é governador, a Renânia do Norte- Vestfália).
Em maio de 2022 será a vez das presidenciais francesas, sendo que grande parte da contenda irá ser decidida nas prévias definições deste Outono-Inverno. Por um lado, porque Macron ainda parece algo dividido quanto ao posicionamento que adotará (mais à esquerda ou mais à direita, mais reformador ou mais laissez faire, laissez passer, mais centralista ou mais descentralizador e territorial, mais ativo na Europa e como ou mais interveniente no plano dos interesses franceses no mundo e das questões globais em geral); por outro lado, porque os seus opositores (Marine Le Pen excluída e, ainda assim, a braços com a incómoda hipótese de uma candidatura diretamente concorrente, a de Eric Zemmour) ainda estão focados nas primárias respetivas (nomeadamente, das áreas socialista e da direita, a primeira onde Anne Hidalgo procura uma déparisianisation que lhe garanta uma autoridade partidária suscetível de ajudar a forjar um consenso imprescindível e a segunda onde Michel Barnier não parece hoje capaz de fazer face às imposições de aparelho (havendo, porém, quem diga que ele tem cartas na manga para jogar nos próximos meses, além de ser um candidato desejado no mais institucional quadro da União Europeia), seja este o de Xavier Bertrand ou o de Valérie Pécresse.
Já o estado de coisas no Reino Unido surge com um perfil diverso, quer porque não condicionado por proximidades eleitorais quer porque bastante mais difuso nos seus múltiplos contornos. Nos últimos tempos, Boris Johnson vai dando algumas asas a policies pouco consentâneas com a ideologia liberal que sempre proclamou e com as expectativas da sua base conservadora de apoio (vejam-se, por exemplo, a furiosa capa do “The Daily Telegraph” de há poucos dias ou o irónico cartune de Ben Jennings e idêntica origem), numa deriva (sincera e aprendida com a experiência?) que tanto pode vir a contribuir para uma sustentação e fortalecimento da sua posição a nível do país no seu conjunto (se o plano for plano e produzir resultados palpáveis em zonas de maior vulnerabilidade para a população) como pode acabar por vir a revelar-se desastrosa para a durabilidade da sua manutenção no poder (se o plano não for verdadeiramente além das intenções declaradas e o primeiro-ministro assim se for isolando, perdendo pau e bola). Sendo que o que está em causa é o clássico problema do quantum de Estado, numa dialética permanente entre mais social e menos fiscal (no caso, até onde deve assumir-se um reforço do NHS e dos cuidados sociais com contrapartida em subida de impostos). Sendo claro que, como quer que seja, nada disto colide com a principal obsessão do primeiro-ministro em relação ao Brexit (a demonstração do bem fundado dessa sua opção “estratégica” domina toda a sua atividade política). Neste quadro, a sensação que prevalece é a de uma enorme indefinição e de uma estranha indiferença cidadã, tanto mais quanto a situação económico-social continua muito complexa e de difícil grau de previsibilidade.
Mudando para um outro registo, o da economia europeia e sua acumulada dependência do quantitative easing inaugurado pelo whatever it takes de Mario Draghi (2012) e mantido até ao presente, uma nota final para o anúncio cauteloso de Christine Lagarde quanto a uma lenta diminuição do programa de compra de ativos que irá ser empreendida e que será objeto de reavaliação mais lá para o fim do ano. São ainda baby steps (ou apenas um menu degustação, segundo Vadot) mas passará por aqui muito do que se viverá na Europa dos restantes anos vinte do presente século.
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