A já clássica inventariação anual dos “mais poderosos” pelo “Jornal de Negócios” — mas qual é verdadeiramente, afinal, o poder que aqui se procura identificar e avaliar? — é uma infantilidade absurda, incompetente e sem critério, qualquer que seja o ponto de vista por que para ela se encare. Nada bate certo quando se percorrem as “escolhas” (e, em alguns casos, as encomendas) dos responsáveis editoriais (e outros, certamente). Nem muito menos se atinge aonde se pretende chegar, que não à venda potencial de mais alguns exemplares do jornal e ao acesso a uma maior boa-vontade por parte de vários protagonistas insaciáveis (entre eles próprios e os seus alegados amigos ou próximos reunidos numa chamada “teia de influência”), agora que já não está no ativo esse tão saudoso “Dono Disto Tudo”.
Quer-se deixar claro que Portugal é um país com forte dependência em relação a Estados e figuras estrangeiras? Ok, mas então porque terá mais poder Ursula do que Marcelo e Costa e estes, por sua vez, mais do que Lagarde, Biden, Xi, Macron, Vestager e João Lourenço? E porque saiu Merkel este ano da lista (onde, no passado, foi primeira durante três anos consecutivos), deixando órfã a influência alemã em Portugal (que está, aliás, de boa saúde e recomendável, independentemente do resultado das eleições que por lá estão à porta)? E porque saiu Zuckerberg da lista sem que 2021 continuasse a contar com o tipo de poder que ele representava?
Quer-se valorizar a importância dos “grandes” da economia portuguesa, entre a Jerónimo Martins, a Sonae e os Amorins (agora já considerados pela cortiça e pela Galp), sem esquecer a Cofina, os Mellos e os Pestanas? Ok, mas os líderes daqueles contam mais do que os destes, especialmente do que Paulo Fernandes? E porque misturar alhos e bugalhos, enumerando uma série de gestores (Macedo da CGD, Maya do BCP, Castro e Almeida do Santander, Stilwell da EDP, Simões do Santander Europa e Pires de Lima da Brisa) cujo âmbito decisional está necessariamente limitado pelo poder dos acionistas (também chineses, espanhóis e angolanos, para além dos fundos americanos e europeus)? E porque está o aflito setor financeiro nacional tão expressivamente qualificado como poderoso, ademais com Paulo Macedo a ser o nosso sétimo mais poderoso?
Quer-se apontar a imprescindibilidade de um recurso à dimensão política central (Marcelo e Costa — porque inverteram o lugar no ranking deste ano? —, Pedro Siza e Leão, com Centeno também presente mas agora apresentado como regulador) para que Portugal funcione nos conformes? E deixam-se assim cair os poderes relativos dos lobistas e influencers a operarem nesse registo (como Arnault e Marques Mendes) e dos grandes advogados de negócios? E porque ficam de fora os poderes surdos e de gabinete?
Se descêssemos abaixo dos 25 mais seguidamente referenciados, os paradoxos persistiriam ou surgiriam mesmo agravados: Mota vende o grupo a chineses e sobe na classificação; os gestores continuam excessivamente na mó de cima (tirando os caso algo especiais de Horta Osório e Carlos Tavares, temos ainda o BPI, a Semapa, o Novo Banco, a NOS e a Altice Portugal); os grandes advogados surgem desvalorizados entre o 35º e o 37º postos; as novas gerações saem do esquecimento de modo amplamente desestruturado (DefinedCrowd, Bial e Farfetch); os políticos “promissores” ou “na defensiva” merecem entradas ainda injustificadas (Pedro Nuno e Ana Catarina ou Rui Rio e Jerónimo); a Justiça sai de cena; duas reguladoras são somadas ao indiscutível Banco de Portugal (CMVM e Autoridade da Concorrência); duas fantásticas “descobertas” conjunturais são também acrescentadas aos poderosos deste ano (o Vice-Almirante e Costa Silva).
Um exemplo de inutilidade e mau jornalismo, este preguiçoso e infundamentado exercício de pura e simples gratuitidade que já teve mais do que tempo de ser repensado!
Sem comentários:
Enviar um comentário