segunda-feira, 14 de fevereiro de 2022

A COESÃO EM ANÁLISE E ALGUMAS EVIDÊNCIAS NACIONAIS

É um dos documentos mais preciosos e elucidativos que são produzidos acerca do “estado da União”, neste caso da União Europeia (UE). Publicado com alguma regularidade, que não anualmente, o “Relatório da Coesão” chegou na semana transata à sua oitava edição e merece bem uma visita cuidada.

 

Dispenso-me, por ora, de aqui divagar em volta dos imensos temas nele tratados e das suas principais conclusões, preferindo sugerir aos verdadeiramente interessados uma leitura, mais aprofundada ou mais cirúrgica, dos diversos capítulos. Direi apenas, recorrendo ao digest oficial, que o relatório: (i) fornece uma imagem detalhada do impacto da pandemia a nível regional, assim como evidencia as tendências positivas e negativas em observação nas regiões, cidades e zonas rurais da UE; (ii) avalia a coesão económica, social e territorial na UE, mostrando que as regiões menos desenvolvidas têm estado em processo de catching up mas também que muitas regiões de transição têm ficado presas numa espécie de armadilha (development trap), ao mesmo tempo que sublinha que a crescente innovation divide dificultará a convergência de ambos os tipos de regiões; (iii) refere que as taxas de emprego são agora mais altas do que antes da crise económica de 2008 mas também que as disparidades regionais ainda estão acima do nível pré-crise, sendo que as mudanças demográficas afetarão todas as regiões nas próximas décadas (força de trabalho e número de estudantes em diminuição e crescimento da população com mais de 65 anos); (iv) salienta que a consolidação fiscal após a crise de 2008 reduziu o investimento público e ainda não recuperou os níveis pré-crise, resultando que o financiamento da política de coesão se tornou cada vez mais importante (passando de 34% para 51% do investimento público entre os períodos 2007-2013 e 2014-2020); (v) aponta as transições verdes e digital como os key drivers do crescimento da UE (esta é a grande “ideologia” subjacente), não sem argumentar que só uma ação política adequada poderá evitar o surgimento de novas disparidades económicas, sociais e territoriais e lançar em conformidade uma reflexão sobre o modo como a política de coesão deve evoluir para responder a tais desafios.

 

Quero ainda deixar alguns apontamentos que julgo especialmente estimulantes do ponto de vista do posicionamento relativo de Portugal. Imediatamente abaixo, dois mapas referentes ao PIB per capita, em 2019 à esquerda (com todas as nossas regiões a situarem-se entre 50 e 75% da média comunitária a 27, excetuando o Algarve entre 75 e 90% e Lisboa entre 100 e 125%, e com apenas algumas regiões do extremo oriental da Europa a surgirem como mais pobres do que a maioria das nossas) e em termos de crescimento médio desde o início do século à direita (com o Norte a crescer mais do que as restantes regiões portuguesas, o Centro e o Algarve numa evolução positiva mais moderada, Lisboa em manifesta perda, a Galiza em destaque no seio peninsular e toda uma faixa de regiões europeias para lá da Alemanha em significativo crescimento).


De seguida, mais três evidências curiosas: (i) a situação de cada vez maior dependência do investimento público nacional face aos fundos comunitários, uma situação que é quase chocante no que toca aos anos do último período de programação (2014-2020), (ii) a enorme pobreza relativa dos níveis despesa e investimento levados a cabo a nível sub-nacional; (iii) os resultados interessantes revelados por um indicador construído pelos autores e indiciador do grau de autonomia de decisão regional (self-rule), onde Portugal se apresenta em posição mais do que medíocre, apenas batendo um país tão incomparável quanto o é o Chipre.

 

Ficam os incentivos selecionados e o correspondente apelo a que os nossos leitores mais vocacionados para tópicos desta natureza possam procurar ir mais longe no detalhe.




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