domingo, 20 de fevereiro de 2022

A POLÍTICA INDUSTRIAL ESTÁ DE VOLTA NA EUROPA?

O comissário europeu para o Mercado Interno, o francês Thierry Breton, tem vindo a revelar um significativo dinamismo no exercício da sua função, comprovando o peso efetivo que possui no interior do presente Colégio e, assim, quanto foi melhor para a União (e para a França) a sua nomeação em vez da chumbada Sylvie Goulard. Isto dito não anula as interrogações e dúvidas que subsistem em relação ao seu passado público-privado nem o facto de Thierry ser titular de uma missão que é francesa antes de ser europeia (veja-se o seu papel decisivo no dossiê da taxonomia energética e da defesa à outrance do nuclear).

 

Todo este enquadramento serve para aqui relevar uma outra das suas iniciativas mais visíveis e dotadas de maior potencial estratégico, a saber, o European Chips Act que lançou, trabalhou e apresentou recentemente com vista a impulsionar a produção de semicondutores europeia (após três décadas de evidente perda, considerados os 40% de quota do mercado mundial que a Europa então detinha) num contexto global em obrigatória e iminente transformação nestes tempos de chips race decorrentes da pandemia e escassez nos fornecimentos, por um lado, e de uma forte pulsão digital e agudização concorrencial, por outro. Em termos de grandes números, o plano comporta um investimento de 42 mil milhões de euros (com um peso muito marcante da despesa em termos de investigação e desenvolvimento) e visa duplicar a capacidade europeia na área dos semicondutores (dos 10% atuais para 20% em 2030), posicionando a Europa como um concorrente a ter em conta no setor (onde a Ásia e, sobretudo, Taiwan são dominantes, respetivamente a 80% e 60%) e proporcionando-lhe a abertura de um caminho de “completo controlo da sua supply chain”.

 

Claro que, como sempre acontece, a opinião pública francesa embandeirou em arco com esta manifestação de poder por parte do seu comissário nacional. E não deixou obviamente de exagerar ― o “Le Monde”, por exemplo, abria deste modo o seu artigo sobre a matéria: “pouco a pouco, tijolo a tijolo, os europeus tentam declinar esse conceito de soberania europeia que fizeram seu, mas que está por construir”. Exageros à parte, o certo é que Breton lá levou a sua carta a Garcia, designadamente no tocante à possibilidade de uma forte subvenção das implantações fabris que conseguiu arrancar à sua colega Margrethe Vestager e à DG Concorrência que ela tutela; desde que se trate de “chips inovadores” (bem-entendido!) e num quadro devidamente “martelado” para se traduzir numa estrita autorização de “ajudas de Estado de um novo género” (?). Assim se vai construindo esta nossa Europa, à martelada e ao pontapé, embora às vezes logrando-se a potenciação de alguns saltos qualitativos não negligenciáveis e, no caso vertente, com o regresso da política industrial a acabar por se constituir numa boa notícia. 

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