José Pacheco Pereira (JPP) no último Quadratura
do Círculo e hoje, no Público, de forma mais estruturada e sem a encenação das
moedinhas e do desenho para a câmara e para os olhares atónitos de Carlos
Andrade, António Costa e Lobo Xavier, nunca tinha ido tão longe na sua crítica
ao PS, à sua liderança atual e às cabeças pensantes que o assessoram em matéria
económica.
Tenho de confessar que, nos últimos tempos de
radicalização da crítica de JPP à governação atual, foi desta vez que tive mais
dificuldade em aderir aos argumentos apresentados, mais na reação a quente ao
programa da SIC Notícias e menos na leitura do artigo de hoje.
A razão mais substancial para a não adesão
imediata às teses de JPP situa-se sobretudo no facto da crítica contundente à
credibilidade da oposição política do PS ao atual governo se basear na
extrapolação que JPP faz do acordo assinado pelo PS quanto ao novo código do
IRC. Não me custa admitir que a liderança do PS pode não ter avaliado bem o
significado de assinar, embora negociando, tal acordo, sobretudo porque o mesmo
teria no Conselho de Concertação Social o espaço institucional ideal para ter
sido consumado e não necessariamente através de um acordo interpartidário. Claro
que uma outra hipótese é sustentar que a liderança do PS avaliou bem esse
significado e, nesse caso, o significado seria completamente diferente. Tenho
dificuldade em alinhar com juízos de intenção dessa natureza.
O PS terá intuído que sendo governo muito
provavelmente teria de aprovar um diploma não necessariamente igual mas
inspirado pelos mesmos objetivos de garantir aos investidores nacionais e
estrangeiros uma estabilidade fiscal de médio-longo prazo. E assim sendo mais
valeria assiná-lo desde já, mesmo correndo o risco de suportar o seu
significado. Como é óbvio, esta avaliação pode traduzir que o PS está de facto
pouco seguro quanto ao timing em que
pretende candidatar-se ao exercício do poder e também pouco confiante quanto à possibilidade
de ver a maioria absoluta referendada nas urnas pelos portugueses.
Mas há um aspeto a que sou sensível. Um partido
de governação e de poder como o PS pode e deve combater abusos de desigualdade
e desequilíbrio de relações de forças entre o capital e o trabalho, que a
abordagem do ajustamento e da austeridade tem como JPP bem o denuncia
exacerbado para além do admissível e não apenas em Portugal. Mas não pode de
modo algum incompatibilizar-se com os empresários e as empresas, pois a
desejada viragem do crescimento não pode deixar de ser baseada no contributo
empresarial, tanto mais que o universo de empresas em Portugal é muito desigual
e não é um tecido abstrato de PME que pode assegurar essa viragem. A criação de
um ambiente de estabilidade e atratividade fiscal faz parte da criação dessas
condições de facilitação do investimento.
Como é óbvio, não estamos perante uma reforma
fiscal abrangente e coerente e, nas condições atuais, não mexer no IRS e no
IVA, mantendo-os em carga tão elevada, tem necessariamente uma leitura política.
Mas nas condições de incompressibilidade de algumas despesas sociais, uma
consolidação orçamental mais lenta e menos abrupta do que a que foi ensaiada
com enormes custos terá sempre de assegurar capacidade de arrecadação de
receitas fiscais. Por isso, qualquer governação alternativa à atual terá
dificuldades em promover de forma imediata a redução da carga fiscal. Além
disso, como Lobo Xavier pertinentemente o assinalou, reduzir a carga fiscal
sobre a lucratividade do investimento não significa isentar os detentores
desses lucros da necessidade de contribuir para o esforço fiscal.
Quanto à autoestrada que se abriu com as políticas
de austeridade a uma profunda transformação das relações entre o capital e o
trabalho, sobretudo entre o capital financeiro e o trabalho, JPP tem todas as
condições para a denunciar, colocando-se do ponto de vista dos ideários
social-democrata e socialista. Mas isso não chega. É necessário criar uma
alternativa nesses ideários à abordagem em curso sobre os tais ajustamentos que
JPP tanto abomina. Mas aqui, JPP que me perdoe, mas o seu contributo para
germinar essa alternativa tem sido nulo. A história e a visão do historiador
pode por certo ajudar-nos. Mas não chega.
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