domingo, 8 de dezembro de 2013

DOHA ROUND



Após um ciclo negocial de 12 anos iniciado em Doha no Qatar, a Organização Mundial do Comércio liderada pelo brasileiro Roberto Azevedo conseguiu finalmente um acordo entre os 159 países signatários daquela organização. O último acordo (Uruguay Round) tinha sido assinado em Marraquexe em Marrocos em 1994. O entusiasmo com que Roberto Azevedo festeja o resultado, conforme imagem do Público de hoje, e se emociona na declaração final, é fruto mais das prolongadas dificuldades com que a negociação se defrontou, do que propriamente pela ambição dos resultados obtidos. Como é óbvio, na situação em que a economia mundial se encontra qualquer rotura das negociações precipitaria o round para as calendas. Nesse contexto, quaisquer progressos, por mais ténues que se apresentem, contribuirão para dinamizar o comércio internacional e por essa via contribuírem para uma dinâmica de crescimento mundial de que os países em situação de transição da sua afetação de recursos para os mercados externos carecem avidamente.
Os resultados alcançados acontecem sobretudo no domínio do que se convencionou designar de protecionismo administrativo, ou seja, toda a série de criatividades administrativas e alfandegárias de que alguns países usam e abusam para desincentivar e dificultar importações de proveniência seletiva. Paradoxalmente, embora se trate de avanços importantes, trata-se também de matérias em que a concretização das decisões ontem assinadas em Bali será mais difícil. Estamos perante domínios de grande obscuridade e passíveis de ocultismo administrativo, além de que é matéria não grata para funcionários alfandegários que perdem poder de alongamento da supervisão administrativa das importações e podem, por isso, ver nas mesmas uma ameaça à imprescindibilidade do seu emprego.
Segundo o que se vai conhecendo do acordo, a harmonização de direitos alfandegários não chegou ao clímax da negociação, o que mostra bem a delicadeza do processo negocial e a impossibilidade de avançar na frente mais decisiva do desarmamento aduaneiro.
Com uma pontaria de timing excecional, o VOX Eu publicou há dias um pequeno paper de Georgios Georgiades e Johannes Gräb, “Growth, real Exchange rates and trade protectionism since the financial crisis” que vem dar algum eco aos resultados obtidos em Bali.
O artigo mostra que na sequência dos acontecimentos que determinaram a crise financeira, os países do G20 (em termos mais intensivos do que as economias emergentes) se dedicaram a diferentes formas do que tecnicamente em linguagem anglo-saxónica se designa de “murky protectionism” (protecionismo obscuro), tais como por exemplo regulamentações sanitárias e de segurança ou outras formas administrativas de desincentivo de importações. Perdas de competitividade nas economias G20 foram assim seguidas de imaginação criativa no controlo de importações, penalizando a extensão e dinâmica do comércio mundial.
Se a investigação de Georgiades e Gräb não suscitar contraditório, os resultados do acordo da OMC assumem, apesar do seu caráter recuado, uma importância a ter em conta para a dinamização futura do comércio mundial.

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