Entre o material e crónicas do fim-de-semana, o
artigo de João Galamba, “O pensamento mágico”, publicado no suplemento de Economia
do Expresso passou pelo meu radar e reteve mais do que outros a minha atenção.
João Galamba é um deputado da geração mais jovem
do PS, quase sempre impetuoso e por isso frequentemente em conflito com alguém
(todos nos lembramos do atrito numa Comissão Parlamentar com o governador do
Banco de Portugal Carlos Costa), mas que no meio daquela modorra parlamentar
acaba por não nos deixar indiferente. De facto, no quadro da notória monotonia
em que o PS se tem colocado em matéria económica, Galamba destaca-se
claramente, pois Eurico Brilhante Dias e o partido para outras paragens João
Ribeiro têm uma presença tão assética e milimetricamente correta que Galamba não
pode deixar de marcar a diferença.
O artigo no Expresso desenvolve-se em torno de uma
imaginativa interpretação do comportamento macro da economia portuguesa nos
segundo e terceiro trimestres de 2013, já aqui comentados a partir dos dados aprofundados das Contas Nacionais do INE. O
argumento é essencialmente o seguinte: o ténue crescimento observado na
economia portuguesa foi essencialmente explicado pelo comportamento da procura interna
(recuperação do consumo e do investimento) que acabou por compensar a
desaceleração e posterior queda do crescimento das exportações; nestas condições,
os dados contraditam a aposta da maioria na alocação de recursos para o setor
exportador e o desejado esmagamento da procura interna. Galamba associa esta dissonância
do comportamento real do Governo face ao desejado pela maioria à ação do
Tribunal Constitucional pela restituição do subsídio de férias de pensionistas e
funcionários públicos e pela declaração de inconstitucionalidade do diploma de
requalificação na função pública que limitou a redução do emprego público. E daí
que segundo Galamba a inversão do ciclo económico representa afinal a negação
dos objetivos da política prosseguida pela maioria.
Interpretação simultaneamente imaginativa e sugestiva.
Claro que necessitaríamos de uma análise empírica mais profunda para situar as
razões do comportamento da procura interna nas duas decisões do Tribunal
Constitucional. A análise dos fatores de um dado ritmo de crescimento apresenta
riscos elevados quando estamos perante quase uma estagnação do produto, mas o
sentido da argumentação é relevante, sobretudo do ponto de vista da antevisão
de 2014. Ou seja: atendendo a que a ligeira recuperação do consumo e do
investimento, sobretudo do primeiro, pode ser varrida pela austeridade anunciada,
a confirmação da recuperação ficará dependente do comportamento das exportações
que terão andar da perna face ao segundo e terceiro trimestres de 2013 para
liderar de novo o crescimento. Caso isso não aconteça, o Tribunal
Constitucional funcionará de novo não apenas como o garante da legalidade
constitucional mas também do comportamento macro da economia. Surpreendente.
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