quinta-feira, 31 de março de 2016

O EMPREGADO DO MÊS OU O MÊS MAL EMPREGADO?


(Klaus Stuttmann, http://www.tagesspiegel.de)

Tem sido um assunto político em foco na Alemanha! Resumo: um programa televisivo satírico (“Extra 3”) da cadeia NDR elegeu Erdoğan como o “empregado do mês” e difundiu um vídeo em que se sucediam imagens do presidente turco e sequências filmadas de atos repressivos na Turquia, tendo por fundo uma canção jocosa intitulada “Erdowie, Erdowo, Erdoğan”. Pois não querem saber que o ministro turco dos Negócios Estrangeiros convocou o embaixador alemão para lhe apresentar um indignado protesto político? E que até já Juncker (não terá mais com que se entreter?) veio pronunciar-se sobre tão edificante matéria? Assim termina um mês, que irá ficar marcado para a história pelo lamentável acordo euro-turco, com o anúncio em beleza do dia das mentiras que chega já daqui a bocado...

A FIGURA NACIONAL DO MÊS

(Cristiano Salgado, http://expresso.sapo.pt)

Não teremos melhor oportunidade do que esta para saudar a enérgica chegada à nossa Presidência da República de Marcelo Rebelo de Sousa. Porque foi claramente de uma pedrada no charco que se tratou, independentemente das críticas de alguns ao seu excesso de recurso à dimensão mediática e a um abuso da forma comentarista, por um lado, e do convencimento de outros quanto ao que possa vir a acontecer no futuro mais ou menos próximo (e vai ser muita a tinta que ainda vai correr, e não necessariamente com um conteúdo do mais consensual...), por outro. Seja como for, é por ora justo que aqui se dê o devido sublinhado a uma atitude que tão salutar se tem revelado para a larga maioria dos portugueses...

LESTER THUROW





Hoje é dia infelizmente de obituário, que tenho dedicado a economistas que de uma forma ou de outra, mais direta ou mais lateralmente, passaram pela minha formação, moldando-a, produzindo por vezes encruzilhadas e bifurcações que, ultrapassadas, definiram um rumo e um caminho.

No passado dia 29 de março e com informação dada pela página do MIT, morreu em Massachussets – USA Lester Thurow, economista que foi entre outras funções DEAN da prestigiadíssima Sloan School of Management desse mesmo MIT. Mas não foi seguramente por esse facto que Thurow passou pela minha formação. Antes pelo contrário, ele marcou a minha iniciação pelo tema da globalização e influenciou largamente as reflexões preliminares que me levaram depois à elaboração de alguns cursos sobre essa matéria.

É curioso que Thurow tenha começado por se interessar pelas questões da distribuição do rendimento na economia americana (com relevo para a obra de 1975 “Generating inequality mechanisms of distribution in the US economy”, para depois se entregar a um estudo da globalização, designadamente quando se começou a falar do paradigma das economias baseadas no conhecimento (Creating wealth – the new rules for individuals, companies and countries in a knowledge-based economy de 1999). Já antes, em 1996, o seu “The future of capitalismo: how today’s economic forces shape tomorrow’ world” apontava na mesma direção, de relevar a importância da educação e do conhecimento, fortemente influenciado pelo modo como a desigualdade perante a educação destruía o mito americano da igualdade de oportunidades.

Thurow pertence aquela classe de economistas que elegeu o público como o principal destinatário das suas ideias, nunca perdendo de vista esse contacto com o público em geral. Pertence por isso a uma classe da qual a economia mundial tem hoje necessidade premente.

UMA QUESTÃO DE LIMITES



Andou por aí, com epicentro localizado nos Estados Unidos da América, uma polémica tempestuosa que dividiu os cidadãos mais conscientes e provocou um justificado alvoroço nas redes sociais. Refiro-me à contenda entre o FBI e a Apple em torno da desencriptação, solicitada pelo primeiro e negada pela segunda, do telemóvel de um dos terroristas do grave tiroteio ocorrido em San Bernardino no final do ano passado. Uma questão que é por alguns considerada incontroversa em nome de melhor se assegurar a segurança de pessoas e bens, mas uma questão encarada por outros como um “precedente perigoso” contra as liberdades individuais e coletivas – o que deve então prevalecer? Digamos que por ora a premência da questão foi adiada em virtude do facto de o FBI ter entretanto logrado entrar no iPhone em causa sem recorrer ao apoio da Apple – mas a questão é mesmo de enorme pertinência e continua sem encontrar uma resposta indiscutível...



(Stuart Carlson, http://www.gocomics.com)

(John Darkow, http://www.cagle.com)

quarta-feira, 30 de março de 2016

A LUTA DESESPERADA POR UMA QUOTA DE EXPORTAÇÕES MUNDIAIS





Não é necessário ser um ás nas coisas da economia para compreender que uma economia global aberta não pode gerar países excedentários e deficitários em permanência, sob pena do equilíbrio dessa economia global estar ameaçado. A prudência manda que a rotatividade entre os excedentários e os deficitários aconteça e essa é a esperança implícita no comportamento das taxas de câmbio em regime de câmbios flexíveis. Os excedentes ditariam comportamentos de apreciação das taxas de câmbio de modo a permitir que os deficitários possam inverter a sua posição.

Ora, nos tempos mais recentes, parece que as economias viraram todas mercantilistas, pretendendo à custa dos seus parceiros comerciais reproduzir os seus excedentes comerciais externos e transformá-los em realidades permanentes. É verdade que os princípios do mercantilismo sempre encontraram no cidadão comum uma grande audiência, pois a aquisição de excedentes comerciais externos permanentes é uma prova de força das economias e isso agrada sempre a um cidadão tocado pelo nacionalismo.

O meu propósito é modesto e pretende tão só demonstrar que, nos tempos presentes, há razões objetivas para que a procura de excedentes permanentes se transforme em necessidade mórbida. A razão parece-me simples. A ilusão entre as economias mais avançadas da economia global, com relevo particular para a Europa, de que a política monetária é suficiente para superar as limitações determinadas pela estagnação económica está a ter um preço demasiado alto. E esse preço corresponde a uma estagnação das procuras internas para além do que seria desejável, social e economicamente falando. Para além disso, as políticas de austeridade determinaram um agravamento dessas condições de estagnação da procura interna e os mercados internos, dos mais amplos aos mais raquíticos, foram amputados de montantes significativos de poder de compra neles aplicáveis. Como é óbvio, a estagnação ou crescimento anémico de alguns desses mercados globais são como é óbvio, numa economia de interdependência global, são fatores de dificuldade de escoamento das exportações. A política em curso atrofia globalmente a economia global, mesmo que admitamos que a consolidação do digital está a transformar o significado e amplitude dos mercados externos. Além disso, em ambiente de armadilha da liquidez, a situação inversa à de excedentes comerciais, a de défices externos, ditaria normalmente o afluxo de capitais às economias externamente deficitárias. Ora, com a poupança desejada a exceder já o investimento realizável, também esse mecanismo de compensação corre o risco de não funcionar.

Em resumo, a viciada gestão macroeconómica global que está a ser imposta leva as economias a uma busca desesperada pelos excedentes comerciais, procurando na procura externa a saída, mas o mercado externo global não é mais do que uma soma de mercados internos abertos. O jogo que daqui resulta é perigoso porque não é seguramente um jogo de win-win.

Já não é preciso dizer que o último exemplo histórico de procura de excedentes comerciais matizada com critérios de geografia da guerra foram os nazis alemães que o praticaram, tal como o patrono deste blogue, Alfred O. Hirschman, o demonstrou numa obra hoje já esquecida.