terça-feira, 15 de março de 2016

A MARAVILHOSA LEVEZA DE PARIS



Deparei-me com a frase acima – correspondendo em pleno ao projeto que eu estava efetivamente a cumprir naquela manhã solharenta deste último Domingo parisiense – na coluna que faz esquina entre a Rue de Béarn e a Place des Vosges (a meu gosto, a praça mais bela de Paris), em pleno bairro do Marais (um dos mais personalizados e incomparáveis da capital francesa).

Como já aqui tenho referido, vivi em Paris nos anos oitenta do século passado durante três anos de intensa vida académica e profissional e de enorme aprendizagem e enriquecimento pessoal. Tenho, também por isso, um especial encantamento pela cidade e pelos seus infindáveis lugares de culto, não tanto pelos que ela obviamente exibe mas sobretudo pelo que ela contidamente parece querer proteger/esconder até ser descoberto por quem o consiga/saiba desvendar. E é assim por isso, com Paris como com o meu Porto de referência última, que “é sempre a primeira vez”...

Retenho, desta minha enésima passagem parisiense, dois momentos culturais de primeira grandeza, duas exposições praticamente ainda em estreia nesta aproximação da Primavera: “Sculptures” de Picasso no renovado museu situado no barroco Hôtel Salé da Rue de Thorigny e que está dedicado à vida, obra e memória do artista, tornando evidente o caráter inesgotável do seu génio e quanto este não se deixava compadecer com fronteiras e limites de qualquer espécie; “Carambolages” no Grand Palais, uma original e belíssima visão da arte em que o convívio de autores como Rembrandt, Man Ray e Giacometti com esculturas de todas as origens geográficas e com múltiplas outras formulações artísticas, ou a mistura quase natural de séculos e séculos de presença e expressão humana, fazem ressaltar a verdadeira essência da arte enquanto veículo de transmissão de sensações/emoções bem mais simples e idênticas entre si, logo bem mais universais e intemporais, do que tendemos habitualmente a admitir. Dois imperdíveis!



No fim de um dia tão cheio no plano cultural/sensorial, nada poderia ter encontrado de melhor do que um momento deliciosamente divertido em que quatro mulheres enchem durante noventa minutos um palco com a sua energia, o seu talento e a sua graça: o espetáculo das “Sea Girls”, entre canção, dança, magia e humor, é um inesperado hino às virtudes ao alcance de um “music-hall” despretensioso mas competente. E assim terminou, em beleza e harmonia, o dia grande do fim de semana parisiense.


A manhã seguinte trouxe-me o surpreendente movimento do Marais ao Domingo, contrastando com o esvaziamento de muitos outros bairros ou com o “só turistas” dos mais famosos. E foi à volta de pessoas e comércio mais parques e jardins que caminhei uns abençoados quilómetros, com destaque para a já atrás saudada Place des Vosges e para aquelas ruas que constituem o mais aconchegado coração do troisième e do quatrième (Francs-Bourgeois, Saint-Antoine, Turenne ou Vieille-du-Temple, nomeadamente). Locais onde me cruzei aliás – o Paulinho que me desculpe! – com a verdadeira “geringonça” (última imagem abaixo, à direita).


Dois apontamentos finais, um dos quais tornado obrigatório por vários próximos: (i) a dimensão gastronómica pura e dura não estava na minha agenda, mas sempre tive que ir metendo algum carburante e isso em Paris é quase sempre sinónimo de boa e refinada cozinha (dois bons exemplos foram os de um excelente italiano numa ruela perto da Concorde e de um bom francês na Cherche-Midi do sixième); (ii) a minha presença à chegada a Paris no concerto de Tony Carreira foi um imprevisto circunstancial, determinado pelo cruzamento de programas combinados entre amigos, mas sempre direi que a experiência foi positiva e menos laboratorialmente sociológica (à la Augusto Santos Silva) do que centrada na notável observação ao vivo da força dos afetos pátrios e de um indiscutível profissionalismo.

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