Sim, eu sei que o contexto do poder judicial no Brasil não
tem absolutamente nada que ver com o nosso sistema. Por cá, há quem
intervenha nas entrelinhas, embora no Alfa Pendular, sobretudo às quintas-feiras,
é possível perceber que vontade de outro tipo de intervenção não é coisa
ausente. Por lá, pelo contrário, a intervenção judicial é em campo aberto, um
juiz proeminente não se coíbe de apoiar na sua página de facebook, pois claro, manifestações
públicas tendentes a afastar o atual governo e de publicar escutas telefónicas
muito comprometedoras para Dilma e Lula. Se calhar, tudo isso é mais transparente.
Mas como simples observador à distância, o que me salta ao teclado é que o
combate político nas ruas não se trava entre um poder que se pretende ver
corrido para a vala comum do esquecimento e uma alternativa política de governação.
Não, o que move aquelas manifestações de uma classe média em lenta formação,
com entradas na população mais desfavorecida, é a perceção de que só o poder
judicial (pelo menos algum) poderá ter a veleidade de impor algum rigor na
coisa pública e varrer pelo menos as dimensões mais gritantes da corrupção. E é
esta estranha conclusão que me perturba. Mas não haverá no Brasil uma oposição
relativamente moderada que possa capitalizar sem ser chamuscada pelo fogo da
corrupção uma movimentação social deste porte? Se essa incapacidade for real,
então teremos um indicador avassalador e endémico dos níveis avançados de captura
do Estado praticamente por toda a classe política. O judicialismo poderá
avançar e uma qualquer força política não vai resistir à tentação de se colar a
um desses protagonistas.
Quanto à circunstancial caída nos braços um do outro de
Dilma e Lula, ela é bem sintomática do abismo que aguarda os dois personagens. Dilma
vê na entrada (se for vencida a batalha judicial em torno do seu impedimento
legal) de Lula para o governo o último dos trunfos para tentar interromper a sua
vertiginosa queda para o impedimento. Lula, por sua vez, aceita a sua entrada
para o governo como o melhor instrumento para fazer valer a sua desesperada
solução de por via política combater o seu encurralamento judicial (onde é que eu
já visto?). Num contexto menos avançado de degradação da situação política, as
visões de Dilma e Lula poderiam ser virtuosas e interagir favoravelmente,
sobretudo se houvesse tempo para algumas medidas à velho Lula. Mas a degenerescência
da situação está já demasiado avançada e por isso as duas visões não são mutuamente
benéficas. Antes em meu entender vão potenciar-se negativamente na direção do
abismo. E no tempo aceleradíssimo que o Brasil hoje vive, o Carnaval já vai lá
longe, os Olímpicos ainda podem esperar e afinal o povo não é parvo, ou não gosta
que o façam de parvo, como alguns humoristas brasileiros mais corrosivos gostavam
de o fazer lembrar.
Um longo ciclo de derrota do distributivismo brasileiro
está em formação, não sabendo que contornos concretos assumirá a sua superação.
Posfácio: o Juiz Catta Preto Neto retirou elementos da sua página de Facebook e terá dito que não eram afirmações para serem tomadas a sério, eram apenas brincadeira. O circo parece estar montado e ainda não sei quem são os palhaços.
Posfácio: o Juiz Catta Preto Neto retirou elementos da sua página de Facebook e terá dito que não eram afirmações para serem tomadas a sério, eram apenas brincadeira. O circo parece estar montado e ainda não sei quem são os palhaços.
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