segunda-feira, 7 de março de 2016

IMAGINEMOS O QUE SUMMERS NOS PROPÕE





Lawrence Summers propõe-nos um jogo interessante no Washington Post que constitui uma forma hábil de demonstrar como está viciada a abordagem global às economias avançadas neste momento de encruzilhada.

Imaginem que as expectativas inflacionárias estavam bem acima da célebre meta dos 2%, medidas por várias vias, que os preços das chamadas commodities estavam claramente em alta, que o dólar tinha atingido picos de valorização não atingidos nos últimos tempos, que o crescimento esperado do PIB era de claríssima aceleração, que o Banco da Reserva Federal americano praticava uma política bem mais laxista do que os mercados estavam antecipar e que nenhum dos países estava a controlar rigorosamente os défices públicos, praticando uma política também laxista em termos de endividamento público.

Se esta combinação de eventos estivesse a ocorrer, certamente que se registaria um consenso generalizado sobre os riscos do laxismo da política e do controlo das expectativas inflacionárias, ou seja, os custos de tais decisões seriam claramente antecipados.

Pois o jogo proposto por Summers vai no sentido de rapidamente intuirmos que a realidade que nos abraça e pressiona hoje é exatamente a oposta da combinação que formulámos. Nenhuma, digo bem, nenhuma das premissas imaginárias que formulámos se observa, antes se observando o seu contrário: baixas expectativas de inflação por todos os indicadores disponíveis, commodities em baixa, produto estagnado, austeridade orçamental, FED com subida arriscada de taxas de referência.

Ora, apesar do reverso da medalha imaginada, a corrente que vai soprando na gestão macroeconómica continua a parecer hesitar em acreditar que estamos mais perto do cenário imaginado do que o real que nos pressiona. Ou seja, um erro de todo o tamanho que penaliza muita gente, que tem custos sociais elevados e que atrofia os que necessitam dessa recuperação no exterior para poderem minimizar o fardo da sua dívida.

Summers pergunta diligentemente: será este reverso da medalha diferente ou menos grave da não intervenção atempada sobre a inflação dos anos 70? Não, a gravidade é a mesma, ou pior. Porquê então a gestão macroeconómica não se adaptar a esse reverso da medalha? Em meu entender, porque a contra-gestão macroeconómica adequada serve muita gente, deriva da plutocracia instalada e da financeirização extrema em que a economia se deixou mergulhar, continua a promover a desigualdade e no caso europeu resulta de um mecanismo de poder ardilosamente transmitido aos tratados com a cega cumplicidade da social-democracia deslumbrada pelas relações ao setor financeiro, pelo “new public management”, pela possibilidade de escapar à pressão do mundo do trabalho.

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