quarta-feira, 30 de março de 2016

A LUTA DESESPERADA POR UMA QUOTA DE EXPORTAÇÕES MUNDIAIS





Não é necessário ser um ás nas coisas da economia para compreender que uma economia global aberta não pode gerar países excedentários e deficitários em permanência, sob pena do equilíbrio dessa economia global estar ameaçado. A prudência manda que a rotatividade entre os excedentários e os deficitários aconteça e essa é a esperança implícita no comportamento das taxas de câmbio em regime de câmbios flexíveis. Os excedentes ditariam comportamentos de apreciação das taxas de câmbio de modo a permitir que os deficitários possam inverter a sua posição.

Ora, nos tempos mais recentes, parece que as economias viraram todas mercantilistas, pretendendo à custa dos seus parceiros comerciais reproduzir os seus excedentes comerciais externos e transformá-los em realidades permanentes. É verdade que os princípios do mercantilismo sempre encontraram no cidadão comum uma grande audiência, pois a aquisição de excedentes comerciais externos permanentes é uma prova de força das economias e isso agrada sempre a um cidadão tocado pelo nacionalismo.

O meu propósito é modesto e pretende tão só demonstrar que, nos tempos presentes, há razões objetivas para que a procura de excedentes permanentes se transforme em necessidade mórbida. A razão parece-me simples. A ilusão entre as economias mais avançadas da economia global, com relevo particular para a Europa, de que a política monetária é suficiente para superar as limitações determinadas pela estagnação económica está a ter um preço demasiado alto. E esse preço corresponde a uma estagnação das procuras internas para além do que seria desejável, social e economicamente falando. Para além disso, as políticas de austeridade determinaram um agravamento dessas condições de estagnação da procura interna e os mercados internos, dos mais amplos aos mais raquíticos, foram amputados de montantes significativos de poder de compra neles aplicáveis. Como é óbvio, a estagnação ou crescimento anémico de alguns desses mercados globais são como é óbvio, numa economia de interdependência global, são fatores de dificuldade de escoamento das exportações. A política em curso atrofia globalmente a economia global, mesmo que admitamos que a consolidação do digital está a transformar o significado e amplitude dos mercados externos. Além disso, em ambiente de armadilha da liquidez, a situação inversa à de excedentes comerciais, a de défices externos, ditaria normalmente o afluxo de capitais às economias externamente deficitárias. Ora, com a poupança desejada a exceder já o investimento realizável, também esse mecanismo de compensação corre o risco de não funcionar.

Em resumo, a viciada gestão macroeconómica global que está a ser imposta leva as economias a uma busca desesperada pelos excedentes comerciais, procurando na procura externa a saída, mas o mercado externo global não é mais do que uma soma de mercados internos abertos. O jogo que daqui resulta é perigoso porque não é seguramente um jogo de win-win.

Já não é preciso dizer que o último exemplo histórico de procura de excedentes comerciais matizada com critérios de geografia da guerra foram os nazis alemães que o praticaram, tal como o patrono deste blogue, Alfred O. Hirschman, o demonstrou numa obra hoje já esquecida.

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