(As relevantes
manifestações deste domingo na Catalunha por uma Espanha plural, tão
expressivas do catalanismo identitário como as que se seguiram aos
acontecimentos do 1-O, mostram que a deriva independentista assenta numa
perigosa viciação da representação política do catalanismo; que o revolucionarismo romântico de uma
certa esquerda portuguesa subsista contra as evidências e apoie a deriva do
radicalismo independentista já me causa alguns arrepios…)
Não vou pelo fácil
caminho de comparar manifestações ou presenças de rua. Estou convicto que uma
parte significativa dos que estiveram na rua no 1-O querendo votar não estão
perfeitamente em linha com o radicalismo da CUP e seus aliados. Estou também
seguro que muita gente que esteve na rua para protestar contra a atuação
policial no 1-O esteve de boa-fé e clamando por uma outra saída para o problema
catalão que não a do confronto violento e suicida. Mas também não tenho dúvidas
de que os falaram este domingo são tão orgulhosos da identidade catalã como os
independentistas. Posso ter dúvidas se, como sugere Francesc De Carreras (link aqui), as
manifestações de ontem significam um antes e um depois para a questão catalã.
Também não tenho dúvidas de que em relação às manifestações de ontem houve menos
aproveitamento mediático do que o observado nos acontecimentos do 1-0.
Não vou entrar também
pelo tortuoso caminho dos processos através dos quais a intervenção policial do
1-O foi mediaticamente trabalhada. Não posso esquecer que a intervenção da
Polícia Nacional e da Guardia Civil só foi necessária porque a intervenção
preventiva que tinha sido decidida não foi aplicada pelos Mossos d’Esquadra,
hoje uma força dividida a meio entre os que seguem o independentismo e os que
recusam fazê-lo. Não vou também explorar a caprichosa maneira como as
autoridades da Generalitat registaram
o número de feridos, primeiro não distinguindo entre feridos e atendidos e,
segundo, estabelecendo como códigos de registo em que até foram contadas como agressões situações
de ansiedade provocadas pelas imagens televisivas.
Parece também evidente
que o independentismo ocultou ao povo catalão os efeitos negativos de uma
declaração unilateral de independência e o que ela poderia significar do ponto
de vista do relacionamento com a União Europeia. Bastaram as primeiras reações
dos principais grupos empresariais catalães, retirando as suas sedes de
Barcelona, para compreender a dimensão da mentira que foi divulgada
insistentemente. Como sabem, por intermédio de sucessivas tomadas de posição
neste blogue, sou um crítico reformista da globalização e nunca o ocultei. Mas
apetece dizer que, como arma contra as derivas vanguardistas, bendita
globalização.
Horroriza-me a captura
dos interesses identitários por parte de grupos políticos manipuladores que são
capazes de colocar uma sociedade à beira do precipício, sem que para isso
tenham enveredado pelo terrorismo sanguinário tipo ETA. Já não me espanta o
recorrente ressurgimento do romantismo revolucionário entre a esquerda
portuguesa, que aparenta já algum cansaço por ter de raciocinar e desenvolver
luta política no âmbito de um “estado de direito”.
Proponho que discutam um
trabalho realizado pelos jornalistas Xavier Vidal-Folch e José Ignacio
Torreblanca do El País (link aqui) designado de “Mitos y Falsedades del Independentismo”,
publicado em 24 de setembro. Merece ampla discussão e os nossos historiadores
Rosas e Loff, tão revolucionários que eles se apresentam, talvez possam
contribuir para essa discussão.
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