quarta-feira, 4 de abril de 2018

COM OS GAL LEADER EM AVEIRO, AMANHÃ



(A convite simpático da FEDERAÇÃO MINHA TERRA, que agrupa as associações dos Grupos de Ação Local – programa LEADER, lá estarei em Aveiro, nas instalações da AIDA, a discutir o instrumento de política pública DLBC (Desenvolvimento Local de Base Comunitária) e os modelos para a sua continuidade no período 2021-2027. Oportunidade para um ponto pessoal de situação do que se antevê em termos de políticas de coesão.)

A Federação Minha Terra reúne amanhã e sexta-feira em Aveiro os seus associados GAL LEADER para discutir o instrumento de política pública DLBC introduzido na programação 2014-2020 que estende a lógica Leader da política de desenvolvimento rural a um campo de programação mais vasto. A discussão é um misto de avaliação de experiência e projeção de expectativas para o período de programação de 2021-2027, embora não esteja ainda disponível nenhuma avaliação sistemática e pouco (de concreto) se saiba sobre o futuro. A simpatia da Ana Paula Xavier da ADRIMINHO é a responsável por este convite e pela aceitação imediata.

Organizarei a minha intervenção segundo quatro pontos fundamentais, com mensagens-chave associadas:
  • ·      1. Uma abordagem testada e promissora nas garras da programação
  • ·       2. Alguns elementos dispersos e não sistemáticos de avaliação
  • ·        3. O que pode ser antecipado como futuro?
  • ·      4. Nota final: DLBC e consistência/coerência de opções estratégicas regionais e sub-regionais.
O PT2020 colocou uma enorme ambição nesta tentativa de estender a abordagem LEADER (essa sim já com avaliações sistemáticas) através da inovação do instrumento de política pública DLBC:

O DLBC visa especialmente promover, em territórios específicos, a concertação estratégica e operacional entre parceiros, focalizada no empreendedorismo e na criação de postos de trabalho. Este enfoque temático que, no âmbito do AP, será promovido de forma concertada envolvendo os vários níveis de atuação (nacional, regional e local), pretende dar resposta aos elevados níveis de desemprego e aos crescentes índices de pobreza, através da dinamização económica local, da revitalização dos mercados locais e da sua articulação com territórios mais amplos e, em geral, da diversificação das economias locais, do estímulo á inovação social e à busca de novas respostas a problemas de pobreza e de exclusão social em territórios … rurais, costeiros e urbanos” (Acordo de Parceria).

Temos assim, aparentemente, um contexto para dar certo. A abordagem LEADER é algo de testado, maduro, com progressiva capacitação e internacionalização. A Fundação MINHA TERRA presidirá proximamente à ELARD associação europeia que agrupa os GAL de toda a UE envolvidos nos sucessivos programas LEADER. Para mais, um instrumento de política pública com continuidade de aposta e por isso capacidade de aprendizagem. Essa abordagem é alargada a intervenções em comunidades pesqueiras e costeiras e em comunidades desfavorecidas de base urbana, numa lógica de dar relevo ao intra-urbano e à sua pobreza em cidades com alguma dimensão. Até aqui tudo bem e uma ideia inspiradora.

Na lógica da programação PT2020, toda ela organizada (diríamos melhor segmentada) em objetivos temáticos e em prioridades de investimento, tipificados à partida, a abordagem DLBC foi organizada segundo cinco objetivos temáticos (financiados por FEDER e FSE), não perdendo de vista a necessária complementaridade com a política de desenvolvimento rural, a cargo do Ministério da Agricultura, outra gaveta. A esta operação costumo chamar de “engavetamento” de uma ideia promissora. Cada gaveta de programação tem os seus “amos e senhores”, com recursos alocados, logo a partir de um dado momento orientados para a aplicação dos recursos que lhes foram alocados. Como é óbvio, a arquitetura da programação não deixa de estabelecer condições organizativas e institucionais para a coordenação e supervisão de tudo isto, mas regra geral acaba por predominar a lógica “TMFD” (Tudo a Monte e Fé em Deus) que é muito típica da nossa programação.

Como imaginam tenho uma memória já vasta e diversificada da génese e implementação de vários períodos de programação, primeiro a partir do ponto de observação CCDR Norte e depois na consultadoria. Assisti, por exemplo, no início deste período de programação, a uma reunião em que o anterior Presidente da CCDR Norte, o Professor Emídio Gomes, resumia publicamente algo de semelhante a isto: vêm aí os russos, perdoem, as DLBC urbanas, anteviam-se para o Norte nessa altura candidaturas de cerca de vinte DLBC urbanas e a CCDR pedia encarecidamente ajuda às CIM representadas na reunião para tentar domar a captura dos recursos disponíveis.

Apesar destas derivas, a programação em curso trouxe à extensão da abordagem LEADER o desafio de uma transição para uma programação em princípio orientada para resultados, com as implicações em termos de capacitação e organização. Nestas coisas, cautela e caldos de galinha recomendam-se. Por isso, o “em princípio” é sempre necessário para impor algum rigor no confronto das ideias promissoras com a realidade.

Uma teoria possível da programação de Fundos Estruturais em Portugal aponta para que nas componentes mais inovadoras, como é o caso do instrumento DLBC, podemos falar de uma sequência de três fases: (i) a da conceção em que as expectativas de inovação ainda pairam no ar sob a forma de esta vez vai ser diferente; (ii) a da regulamentação em que os “amores e senhores” das gavetas recuperam poder; (iii) a da execução em que a inércia pode recuperar, tirando partido dos maiores constrangimentos à execução do que é inovador na programação: a inércia adota a postura de “deixa-os pousar”. E, assim, frequentemente, se regressa às práticas que se pretendia alterar.

Na programação atual, estratégias regionais, sub-regionais (as EIBT Estratégias Integradas de Base Territorial elaboradas pelas CIMs NUTS III) e as DLBC de base local nem sempre tiveram tempos e ritmos de elaboração sincronizados. A informação entre os diferentes exercícios de planeamento foi heterogénea e nunca suficientemente partilhada. A relação entre as CIMs e as DLBC exige ainda uma grande aprendizagem, sobretudo para induzir uma lógica de cooperação e não de hierarquia. Os municípios têm aqui um papel crucial pois estão presentes nos três espaços – regional, sub-regional e local, e também um grande desafio à coerência da sua intervenção nos três espaços.

Do ponto de vista futuro, a incerteza ainda é muita, seja no plano europeu, seja no nacional. No europeu, a ausência de uma estratégia alternativa à Europa 2020 vai colocar a negociação da política de coesão em condições difíceis, onde diplomacia de bisturi será necessária. As consequências para o plano nacional são agravadas por um condicionante representado pela segunda figura que encima este post. Portugal é segundo dados da Comissão Europeia o país da União em que os Fundos Estruturais da Coesão representam um maior peso do investimento público, quase 85%, uma barbaridade. Qualquer oscilação na política de coesão refletir-se-á no investimento público nacional, a não ser que arrepiemos caminho, assumamos escolhas públicas com maior clarividência e finalmente o investimento público de orçamento nacional tenha desenvolvimento que se veja. A negociação será difícil e não devemos esquecer que reformas irão produzir-se na Política Agrícola Comum orientando-a progressivamente para o tema da “better life in rural areas”.

Do que se conhece a nível nacional, pelo menos no objetivo transversal sustentabilidade demográfica, a abordagem DLBC terá um papel a desempenhar, acaso para esta prevaleça uma abordagem não estritamente demográfica. Já nos objetivos com incidência territorial, o instrumento DLBC tem uma palavra nos domínios “Economia do Mar” (caso haja por aqui finalmente uma clarificação de programação e investimento), na “Competitividade e coesão na baixa densidade” e obviamente na “Agricultura e florestas”.

Uma reflexão final sobre o papel do instrumento DLBC na abordagem à baixa densidade. Não devemos ignorar a mudança de perceção que os Portugueses hoje têm (após os acontecimentos de Junho e Outubro de 2017) da baixa densidade e das suas fragilidades e vulnerabilidades. Em meu entender, a abordagem LEADER/DLBC terá um papel tanto mais decisivo quanto mais for possível garantir na próxima programação: (i) opções e investimentos coerentes no plano regional e sub-regional que a integre e reforce complementaridades entre si; (ii) Investimento municipal alinhado e racionalizado na lógica intermunicipal e sub-regional com as estratégias locais e (iii) investimento público consequente e gerador de externalidades agregadoras.

Sim, tiremos o cavalinho da chuva: inversões de tendências como aquelas que são solicitadas para a baixa densidade em Portugal exigirão investimento público que se veja.

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