(Não contem comigo para relevar os “pés na argola” do PT. Em
post anterior, desenvolvi uma história moral sobre o Brasil de hoje, “Lula, o sistema
e a armadilha”. Mas muito menos contem comigo para branquear o golpe autocrático
e corrupto. Por isso dou espaço neste blogue à palavra de Mino Carta.)
Sob o lema “intérpretes
de um país sem futuro” a prosa de Mino Carta chegou-me pela mão sempre na
mouche do meu amigo Pedro Souza. Mino, ex-diretor da Veja, dirige agora o Carta
Capital (link aqui).
Aqui está o
que ele nos diz:
Intérpretes do país sem futuro
por Mino Carta
“O maior objetivo do golpe parece atingido, e
nem por isso os golpistas no poder esperam conservá-lo nas urnas.
O espetáculo encenado pelo STF dia 4 de abril
de 2018 é altamente representativo da tragédia de um país medieval chamado
Brasil. Há tragédias e tragédias, a nossa é tosca, grosseira, vulgar, a ponto
de assumir o tom e o ritmo da pantomima e precipitar no ridículo.
Não, não falarei do senhor Fux, ou do senhor
Barroso e de outros fantasiados de magistrados, e não farei referência aos seus
pronunciamentos indecifráveis aos ouvidos da larguíssima maioria dos
brasileiros e de bilhões de habitantes da bola de argila a girar em torno do
Sol.
Não direi do provincianismo troglodita que
estabelece elos evidentes entre o STF e a Academia Brasileira de Letras, com a
única vantagem a favor desta de não transmitir pela televisão os seus célebres
chás.
Afirmo apenas que o clube dos supremos
togados é o primeiro responsável pelo estado de exceção que engole a todos como
um abismo sem fim.
A mais alta corte de países democráticos e
civilizados é a guardiã da Constituição, defensora irredutível do Estado de
Direito e santuário de baixíssimo perfil.
Ouvi os nossos patéticos togados aludirem com
pompa grotesca à constitucionalidade deste ou daquele ato, quando eles mesmos
permitiram que a Constituição fosse rasgada por ocasião do golpe de 2016, e
rasgada permaneça até hoje, bem como a demolição sistemática do Estado de
Direito.
O golpe começa com a aquiescência do Supremo,
o beneplácito, o nihil obstat.
E são eles mesmos, os caricatos ministros,
que descumpriram clamorosamente o seu papel ao não coibir, conforme lhes
competia, os desmandos da Lava Jato, na sua impecável imitação dos tribunais do
Santo Ofício na encenação dos autos de fé.
A atuação da promotoria confunde-se com a do
juiz, este fala com a mídia que o endeusa, enquanto demoniza o réu, a
imparcialidade que haveria de caracterizar seu desempenho vai-se pelo ralo, mas
trombeteia-se a estreia de um filme sobre as façanhas do pavão de camisa preta
a apontar o culpado antes da conclusão do processo.
As delações valem se o delator diz aquilo que
o Ministério Público quer escutar, se não diz continua preso nas piores
condições, forma refinada de tortura.
E que dizer do presidente do TRF4, que,
depois da condenação sem provas de Lula em Curitiba, define como irrepreensível
a sentença de Moro, embora o processo ainda não tenha alcançado a segunda
instância?
Em países democráticos e civilizados, os
juízes de Curitiba e Porto Alegre teriam sido prontamente exonerados pela alta
corte.
O STF soletra o que somos, na tragédia e no
ridículo.
E só faltava o pronunciamento do general
Villas Bôas, o fardado que em certos momentos pareceu respeitar seus deveres
constitucionais. E lá vem ele, com o tom dos generais de um exército de
ocupação. Preocupa-se agora com a impunidade. De quem? De Lula? Ou de tantos
mais?
O maior objetivo do golpe, afastar o
ex-presidente do próximo pleito, parece atingido e nem por isso os golpistas no
poder podem esperar conservá-lo nas urnas.
E, com as palavras do general, expande-se a
incógnita no país sem futuro.”
Contundente,
mas no Brasil não há espaço para falinhas mansas.
Sem comentários:
Enviar um comentário