Já tinha referido
neste espaço que me parecia que a decisão de associar a Puigdemont o crime de
rebelião tal como está configurado na lei espanhola me parecia uma via demasiado
sinuosa. Tão mais sinuosa quanto o juiz Llarena equiparou na sua argumentação o
ato de Puigdemont ao do militar espanhol Tejero que irrompeu pelas Cortes
Espanholas aos tiros no que pareceu um golpe palaciano à espanhola, violento sobretudo
pelo simbolismo de ser perpetrado contra a casa da democracia em Espanha. Pareceu-me
que tal equiparação remetia para uma visão desproporcionada das coisas, não
sendo claro em que medida o juiz espanhol seria ou não capaz de identificar nas
derivas independentistas sinais evidentes de violência que o conceito jurídico de
rebelião obriga.
Pois o
tribunal alemão acabou por destruir essa associação, decidindo que, a ser possível
a extradição para Espanha, ela não poderia ser justificada pela figura da
rebelião. E mais, em consonância com a decisão, decidiu admitir a libertação
sob prestação de fiança, até que a justiça alemã se decida sobre a
possibilidade de extradição e sobre o fundamento jurídico que a pode justificar.
Não é uma
vitória de fim de partida para Puigdemont, diríamos que se trata de uma vitória
de primeira parte, mas creio que o peso do resultado ao intervalo é mais cáustico
para a justiça espanhola. E o que é ainda mais importante é a cada vez maior possibilidade
dos independentistas terem conseguido uma espécie de internacionalização do seu
caso, colocando sob pressão o Supremo Tribunal em Espanha. Esta é uma outra
dimensão em que o governo de Rajoy tem manifestado uma inépcia política de
bradar aos céus, permitindo que a referida internacionalização vá acontecendo,
alargando e diversificando os palcos para a defesa do Procès. Se o facto de na Alemanha terem sido os partidos de extrema-direita
que deram alguma atenção e consolo a Puigdemont, facto claramente favorável ao
governo espanhol, esta decisão do tribunal de Schleswig-Holstein projeta a
internacionalização para uma outra escala. Não sou especialista para vos dizer
se nestas matérias haverá diferenças assinaláveis entre o direito alemão e o
espanhol. Mas de qualquer modo o espaço e as vias de decisão para o Supremo em
Espanha alteraram-se substancialmente, o que não significa que Puigdemont não
venha a ser extraditado. Não sei agora se o acusado terá de esperar pela decisão
judicial na Alemanha ou se poderá circular e regressar ao reduto de Bruxelas. Talvez
seja obrigado a permanecer na Alemanha. Mesmo que seja esse o caso é de uma
folga de ação que se trata.
Os que esperam, como eu,
uma solução política para toda esta questão, que através de uma possível amnistia
política possa fazer o reset de toda esta
situação e convidar ao bom senso dos intervenientes, tenderão a achar que se
abre mais uma oportunidade. Mas cheira-me que de um lado e do outro esse bom
senso não prevalecerá. E o jogo poderá ter uma segunda parte complicada, possivelmente
com prolongamentos até mais vir.
A política
será uma arte. Mas com artistas de fraco calibre as performances não se
recomendam.
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