(Eu sei que, face aos ensinamentos do passado, o modelo
de aposta nos não transacionáveis que os famigerados “vistos gold” ocultam não
se recomenda a ninguém. Mas há por aí umas mentes peregrinas que, saudosas do aparente
fausto que aquele modelo proporcionava, se esfalfaram por trazer para norte
essa “pérola”. Mas a crueldade dos números deveria
justificar um completo reset, dos que fazemos quando as máquinas se recusam a
funcionar.)
O modelo dos não
transacionáveis deu emprego a muita gente, lucros chorudos a alguns e criou no
país a típica ilusão dos El Dorados deste calibre. Como o modelo se projeta
sobretudo em imagens urbanas de grande expressão, o português médio gosta de
obra e da alta, mesmo que tenha frequentemente que sofrer os dissabores
quotidianos de estaleiros quase sempre organizados sem grande respeito pela invasão
do espaço público e das suas amenidades.
As vicissitudes da
transição entre as décadas de 2000 e 2010 e a penosidade do ajustamento que se
lhe sucedeu mostraram as contradições entre os ganhos de alguns e a má alocação
de recursos que o modelo tendia a gerar.
A economia portuguesa
que emergiu dessa longa fatalidade apresentou-se à míngua de capital e de
investimento e é nesse contexto que se pode compreender a submissão ao pilim do
capital angolano e chinês e também a invenção dos “vistos gold”. Se é verdade que,
numa fase muito embrionária, o estratagema serviu para evitar a agonia da
construção civil (salvando os destroços da mesma), é óbvio que para além de um
certo limite se percebia imediatamente que o modelo não fazia mais do que
prolongar o malogrado modelo dos não transacionáveis, com expressão na construção
de luxo. E embora em não correlação direta com o esquema dos vistos gold é
também nesta fase que os fundos de investimento imobiliário de expressão
internacional entram na economia portuguesa atraídos pela oportunidade.
Com a nossa memória
tipicamente curta, saudosos do fausto aparente do pico do modelo e à míngua de
capital, houve gente a norte que esperou que desta vez e finalmente também o
Norte e mais propriamente a AMP seria beneficiária. Gente de mentalidade
peregrina que zurze na capital mas que na próxima curva é sempre apanhada a
mimetizar o modelo da capital.
Os números que vieram
a público são na perspetiva dessa gente cruéis. A AMP terá apropriado 1% apenas
do bolo dos vistos gold, ficando o bolo apetecido entregue a Lisboa e
sua Área Metropolitana e ao Algarve.
Está tudo dito e
confesso-vos que nunca um número revelador da inferioridade do Porto e sua AMP
me soube tão bem. O 1% mostra-nos que não é por aqui que devemos seguir. Por
mais que custe aos saudosos do antigo modelo e sobretudo aos mundos da
construção e da imobiliária que deverão estar confinados a uma quota de
recursos compatível com a viragem para o exterior e não à ilusão de que podem
ser motor de desenvolvimento.
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