(Já há algum tempo que a ideia de Estado-empresário-inovador
proporcionou alguma pompa e circunstância à economia italiana de Sussex,
Mariana Mazzucato, formada sob a influência de obras como a de Chris Freeman e
de Carlota Pérez. A política chinesa das telecomunicações
parece seguir essa orientação e, apesar dos esforços de Trump, tal política
parece ter reconhecimento extramuros.)
Tenho de confessar
que o aparecimento em 2011 do The Entrepreneurial
State de Mariana Mazzucato
não me impressionou por aí além. Quem tenha lido com atenção alguns escritos
seminais de Nathan Rosenberg sobre a história económica da tecnologia e sobre o
modo como alguns paradigmas tecnológicos se impuseram percebeu então que a
relevância do setor público na consolidação de algumas trajetórias de
desenvolvimento tecnológico é crucial. Por exemplo, toda a aposta realizada pelos
EUA na área da defesa e do aeroespacial teve repercussões laterais cruciais e
sem esse impulso não teriam sido conseguidos impulsos fundamentais em termos de
investigação básica.
Vem isto a propósito
de uma das facetas menos divulgadas da guerra comercial entre os EUA e a China,
relacionada com a questão das telecomunicações e com a desculpa pública apresentada
por Trump de que a Huawei representava em última instância uma ameaça à
segurança mundial pelo caráter intrusivo da sua estratégia de afirmação pelo
mundo e pelo risco que representava em matéria de cibersegurança para o
ocidente.
Pois o Reino Unido de
Boris Johnson não para de nos surpreender, embora, como alguém escrevia hoje no
Guardian, um dia depois de se consumar o BREXIT o intrépido Boris terá já
compreendido que a sua força negocial em matéria de tratados comerciais não
será a mesma depois de se concretizar a saída da União Europeia.
Trump deve ter esperneado
quanto baste quando tomou conhecimento que o Reino Unido concedeu à Huawei um
papel determinante no desenvolvimento da sua infraestrutura de
telecomunicações, mais propriamente no âmbito das redes 5G. Que se saiba Trump
não esperneou mas segundo o Financial Times (link aqui) um senador republicano assinou esta
sentença mortífera: “O partido comunista Chinês tem a partir de agora uma
passadeira vermelha para concretizar a sua espionagem invasiva da sociedade
Britânica e aumentou a sua influência económica e política em relação ao Reino
Unido”.
Embora reconhecendo
tais riscos, o Reino Unido não é propriamente tonto nestas matérias e, ainda
segundo o Financial Times, tal decisão o que traduz é a evidência de que a
China não tem brincado em serviço nestas matérias. Sei lá se terão ou não lido
Mazzucato, mas inclino-me mais para que tenham estudado com atenção a história
da tecnologia e compreendido a relevância do impulso público no traçado de uma
trajetória tecnológica que se afirme por custos imbatíveis na sua adoção.
No balanço entre
custos sedutores e eventuais riscos de segurança o que terá conduzido á decisão
britânica foi o primado dos baixos custos, já não falando no peso que a Huawei
já apresenta no Reino Unido nas redes 4G. E a verdade nua e crua é que a Huawei
é já hoje o principal produtor mundial de equipamento de telecomunicações.
Segundo a notícia do Financial Times que me serve de guia, o investimento em
I&D no setor atingiu, em 2018, 15, 1 milhões de milhões de dólares, mais do
que a realizada pela Nokia e Ericsson juntas.
E não posso deixar de
recordar que, à luz de uma visão um pouco simplificada da economia das ideias,
a produção de I&D acaba por depender em última instância da massa de
população. Basta pensar que 1% de engenheiros ocupados na China em atividades
de I&D representam uma massa de produção de ideias incomparavelmente
superior ao que percentagem idêntica determina nos EUA ou no Reino Unido.
Estamos feitos, sem ou
com coronavírus a instalar o pânico na economia global.
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