(In Richard Baldwin e Rikard Forslid, "Globotics and development: when manufacturing is jobless and services tradable", National Bureau of Economic Reserach, fevereiro de 2020)
(Um tweet de Dani Rodrik (@rodrikdani) alertou-me para
este artigo de Richard Baldwin e Rikard Forslid, sendo o primeiro talvez o
maior especialista mundial do binómio globalização e tecnologia. A mensagem de Rodrik referia que, após a leitura deste artigo, o seu
otimismo quanto ao futuro pós-industrial dos países menos desenvolvidos tinha
aumentado. Não será um otimismo precoce?)
Existem fundados
receios de que o futuro pós-industrial dos países menos desenvolvidos seja ameaçado,
quer por processos de industrialização falhados na sequência de apostas
públicas erradas, quer pela desindustrialização precoce observada em muitos
desses países.
O fundamento para
esses receios está na evidência relativamente generalizada de que a
industrialização constitui um fator de enorme aceleração dos processos de desenvolvimento
económico e das mudanças estruturais que lhe andam associadas. Essa influência
é, sobretudo, exercida pela via dos aumentos de produtividade e de divisão
interna do trabalho que tais processos tendem a potenciar e pelo aproveitamento
das oportunidades que a economia mundial abre aos neófitos da industrialização,
já que funciona por ondas de entrada de países capazes de apresentar em mercado
mundial relações produtividade-salários sucessivamente melhores que os seus antecessores,
à medida que estes experimentam subidas salariais.
Sabemos que é preciso
ter cautela com a presunção de que a economia assenta em leis universais que
comandam os processos de desenvolvimento. Os “factos estilizados” (expressão
que devemos ao incontornável Kaldor) tendem a ser mutáveis para longos períodos
de tempo e o que constitui regularidade em economias avançadas pode não o ser
nas economias menos desenvolvidas que buscam a sua oportunidade (e lugar) na
economia mundial.
Por outro lado, a
história do subdesenvolvimento mostra-nos que as terciarizações precoces (ou
seja para baixos níveis de rendimento per capita) de economias menos
desenvolvidas tendem a coexistir com anomalias de mudança estrutural nessas
economias, gerando evidências que a economia do subdesenvolvimento estudou em
profundidade como a emergência da chamada “burguesia compradora” gerada
pela terciarização associada aos processos de exportação de produtos primárias.
Tudo isso é do nosso
conhecimento, mas a economia mundial e o comércio internacional estão em
profunda transformação. A investigação de Baldwin, materializada nos seus livros
mais recentes já aqui referenciados (The Great Convergence – Information Technology
and the New Globalization, The Belknapp Press of the Harvard University Press,
2016; The Globotics Upheaval: Globalization, Robotics, and the Future of Work, Oxford
University Press, 2019), vem trazer novas e vibrantes perspetivas sobre o
assunto, já que é o primeiro a analisar articuladamente a evolução da
globalização e o efeito que as tecnologias da robotização estão a provocar
nessa mesma globalização.
Baldwin (ver link aqui para o artigo) considera que
a combinação da nova globalização e dos processos de robotização/automação
estão a transformar os motores de crescimento, comparando para isso as trajetórias
de dois gigantes, a China com uma via de industrialização e a Índia puxada pela
exportação de serviços. Ou seja, as vantagens de entrada na globalização por
via de relações favoráveis produtividade-salário não necessitariam de ser
asseguradas por processos de industrialização e antes por processos de
exportação de serviços.
A tese central de Baldwin
é a de que a robotização e revolução digital produzem efeitos opostos na
industrialização e na terciarização: na primeira, deixa intactos os custos de comercialização
de mercadorias e faz descer a quota do trabalho no produto; na segunda, reduz
os custos de comercialização e deixa intacta a quota do trabalho no produto.
A tese é aliciante e
abre se tiver generalização assegurada novas trajetórias de desenvolvimento aos
que aspiram participar mais abertamente na economia mundial e na divisão
internacional do trabalho.
O facto do suporte
empírico da investigação incidir inicialmente em dois gigantes, China e Índia,
pode dificultar a sua generalização, já que economias de mais pequena dimensão
podem não poder aspirar a uma massa relevante de recursos para a exportação de
serviços.
Além disso, está por estudar
quais vão ser os processos de desenvolvimento desigual que vão estar associados
à divisão internacional do trabalho no âmbito dos serviços.
É assunto para manter
olho atento sobre o mesmo. Até porque há por cá algumas mentes peregrinas e
bastante emprenháveis por ouvido que estariam dispostas a sacrificar a base
industrial que conseguimos manter, com fortes assimetrias de capacidade de
gestão e de internacionalização eu sei, pela atração da especialização dos
serviços. Já estou a imaginar o Félix Ribeiro, de olhos fechados e em profunda
meditação de concentração, a dissertar sobre o assunto, com a ressalva de que
pelo menos não é dos que emprenham facilmente pelo ouvido mas que investe na
sua própria reflexão.
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