(Através de jornais espanhóis e de algumas conversas com
amigos espanhóis li algumas coisas dispersas de Antonio Gamoneda, poeta de León,
terra de que tenho saudades e prémio Cervantes em 2006, e nunca a sua poesia
completa nem sequer as suas memórias. Porquê então
dedicar-lhe o post de hoje?)
Os seus 88 anos e 85
de residência em León fazem de Gamoneda um símbolo da cultura espanhola, da sua
continentalidade leonesa, não de nasciment, mas de residência desde tenra
idade.
A sua entrevista ao
El País, publicada no Babelia do passado sábado e agora em acesso livre on
line (ver link aqui) comemora a publicação do seu segundo volume de memórias,
dedicado ao tema da Pobreza. Pelos seus relatos na entrevista, imagina-se a
importância da sua memória dos tempos difíceis de pobreza que terá vivido e
toda a sua ascensão até ao reconhecimento oficial da sua poesia por via do
Prémio Cervantes de 2006. Relatos que atravessaram toda a Espanha franquista,
incluindo a sua passagem pela guerra civil e suas privações enquanto criança e
a sua passagem pelo Partido Comunista espanhol.
O seu segundo volume
de memórias será apetecível para recolher testemunhos do que foi a Espanha
profunda da pobreza. Mas o que me leva a dedicar-lhe a reflexão de hoje é uma
citação da sua entrevista ao El País, que me sugeriu aliás o título do post:
O jornalista fala-lhe
da sua expressão “cultura da pobreza” e pergunta se ela existe. Gamoneda
responde-lhe assim:
“Sim. Não é
invisível, mas está invisibilizada. Conhecer a pobreza
objetivamente como um sociólogo ou um antropólogo não é o mesmo do que vivê-la por dentro. O
que se solidariza com o pobre não é igual a ele. Não digo que seja melhor ou
pior, digo que é diferente. Por isso digo também que as fomes históricas
modificam para sempre o pensamento dos esfomeados”.
Mais adiante, o
jornalista recorda-lhe a sua entrada nas fileiras do Partido Comunista. Gamoneda
responde:
“Os pobres reconhecem
facilmente donde provém o que os oprime, sabem de marxismo sem necessidade de
ler um livro que seja. Entendem melhor do que ninguém conceitos como valor ou
salário. Todo o que tem fome é um microeconomista.”
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