terça-feira, 11 de fevereiro de 2020

POETAS E ECONOMIA



(Através de jornais espanhóis e de algumas conversas com amigos espanhóis li algumas coisas dispersas de Antonio Gamoneda, poeta de León, terra de que tenho saudades e prémio Cervantes em 2006, e nunca a sua poesia completa nem sequer as suas memórias. Porquê então dedicar-lhe o post de hoje?)

Os seus 88 anos e 85 de residência em León fazem de Gamoneda um símbolo da cultura espanhola, da sua continentalidade leonesa, não de nasciment, mas de residência desde tenra idade.

A sua entrevista ao El País, publicada no Babelia do passado sábado e agora em acesso livre on line (ver link aqui) comemora a publicação do seu segundo volume de memórias, dedicado ao tema da Pobreza. Pelos seus relatos na entrevista, imagina-se a importância da sua memória dos tempos difíceis de pobreza que terá vivido e toda a sua ascensão até ao reconhecimento oficial da sua poesia por via do Prémio Cervantes de 2006. Relatos que atravessaram toda a Espanha franquista, incluindo a sua passagem pela guerra civil e suas privações enquanto criança e a sua passagem pelo Partido Comunista espanhol.

O seu segundo volume de memórias será apetecível para recolher testemunhos do que foi a Espanha profunda da pobreza. Mas o que me leva a dedicar-lhe a reflexão de hoje é uma citação da sua entrevista ao El País, que me sugeriu aliás o título do post:

O jornalista fala-lhe da sua expressão “cultura da pobreza” e pergunta se ela existe. Gamoneda responde-lhe assim:

Sim. Não é invisível, mas está invisibilizada. Conhecer a pobreza objetivamente como um sociólogo ou um antropólogo não é o mesmo do que vivê-la por dentro. O que se solidariza com o pobre não é igual a ele. Não digo que seja melhor ou pior, digo que é diferente. Por isso digo também que as fomes históricas modificam para sempre o pensamento dos esfomeados”.

Mais adiante, o jornalista recorda-lhe a sua entrada nas fileiras do Partido Comunista. Gamoneda responde:

Os pobres reconhecem facilmente donde provém o que os oprime, sabem de marxismo sem necessidade de ler um livro que seja. Entendem melhor do que ninguém conceitos como valor ou salário. Todo o que tem fome é um microeconomista.”

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