(A Companheira resolveu, intrépida para a nossa idade,
fraturar o pulso direito, rotinas alteradas, corredores, esperas, intervenção
cirúrgica, trabalhos para acabar no sossego do quarto de acompanhante,
consequentemente perturbação explicável do blogue. Encontremos, pois, matéria de reflexão neste contexto atípico.)
O mundo do futebol
está a transformar-se num ambiente irrespirável. Ficamos com a impressão de que
se todos os intervenientes neste universo, incluindo os espectadores de sofá
perante a televisão, tivessem comportamentos reativos de dignidade como Moussa Marega
este mundo futebolístico estaria com ar bem mais arejado.
Mas não. O
comportamento racista das multidões ululantes é apenas uma gota de água num
complexo de degenerescências em relação às quais vamos encolhendo os ombros,
indiferentes, com a desculpa de que estamos apenas interessados na vivência do
espetáculo (cada vez mais degradado ele próprio, salvo alguns jogos de exceção).
E tudo isto gera
contradições. A maior contradição está no facto da Federação Portuguesa de
Futebol ser presidida por um homem de bem, aparentemente dissonante em relação
ao universo que o rodeia, e à sua volta as degenerescências acontecem como se o
próprio estivesse estranhamente imunizado face a tanta anomalia e comportamento
desviante.
Com uma premonição
que é de salientar, recordo-me que quando José Pacheco Pereira apoiou reflexiva
e intelectualmente a cruzada anti-FCP que Rui Rio protagonizou na cidade do
Porto, e que muita gente erradamente admitiu que lhe custaria derrotas, o historiador
atacava sobretudo o mundo sinistro, típico do lúmpen proletariado, que girava
em torno de claques e da massa associativa mais agressiva. Tal acusação
revelou-se certa e a propósito, já que o fenómeno se tornou viral como agora se
diz, atravessando a generalidade dos clubes, embora notoriamente mais agressivo
nos maiores e com maior massa de adeptos.
O que tem acontecido
pelas bandas de Alvalade não é pior ou melhor do que pode acontecer noutras
agremiações. Aconteceu simplesmente porque houve um combustível populista
chamado Bruno de Carvalho que preparou com tempo a combustão e que aproveitou o
momento X para fazer eclodir o preparado. O pobre Frederico Varandas é outro
exemplo da contradição tipo Fernando Gomes e aguenta o prolongamento da
combustão sabe-se lá até quando.
A situação é complexa
porque as degenerescências de que falei são interdependentes e reproduzem-se
dada essa interdependência. Por exemplo, as claques mais degeneradas existem
porque interessam a alguns modelos de dirigentes desportivos, para se perpetuarem
em função de critérios que relegam a qualidade da gestão para o caixote das
inutilidades.
Vontade política para
dar um murro nesta tralha e tornar o ar mais respirável não há. Afinal, há
sempre um bilhetinho à espera do ministro para ver o clube do seu coração e
isso vale muita coisa.
Somos todos Marega?
Sim é possível, mas é sempre mais fácil bater no peito do que dar murros na
mesa para limpar o ambiente.
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