sábado, 9 de maio de 2020

O QUE COMEÇA MAL …



(Estou estupefacto e temendo ameaças futuras. O empréstimo ao Novo Banco e a aparente contradição informativa entre António Costa e Mário Centeno sobre a sua existência são coisas de um outro mundo que não se recomenda para os tempos que se avizinham. Sujeitar um país frágil como Portugal ao experimentalismo da solução para o Novo Banco, inventada sabe-se lá por quem e, honestamente temos de o admitir, surgida num contexto de alternativas possíveis igualmente arriscadas, teria de produzir consequências a prazo. E, entretanto, os autores reais das falcatruas continuam a aguardar que a justiça tropece nas suas próprias limitações).

Não me parece que a contradição registada entre o primeiro-Ministro e o ministro das Finanças seja uma invenção jornalística. Muito menos terá origem nalguma armadilha preparada pela esquerda mais à esquerda da agora expectante geringonça. Sabemos que a tensão da decisão política está ao rubro e que nem tudo é coordenável ou passível de informação a quem de direito nos processos. E também não parece plausível que António Costa tenha passado por uma quebra momentânea de atenção.

Neste contexto de presunções plausíveis, o que inquieta nesta contradição de registo é a margem de liberdade que permite para todas as deduções. A matéria dividiu o governo? Há razões na origem do empréstimo, inerentes à situação do Novo Banco, que não tenham sido reveladas e que anunciem caça grossa em termos de viabilidade do banco e por isso passível de arruinar todo o experimentalismo com que BCE, Comissão Europeia, Banco de Portugal e governo de então decidiram “cobaiar” este país? Será que Mário Centeno forçou a nota para se pôr ao fresco em direção a dois destinos provavelmente fechados, como a governação do Banco de Portugal ou a continuidade no Eurogrupo? Será que o relacionamento entre as duas personalidades é mais problemático do que tem transpirado?

Qualquer das hipóteses incomoda. E pesa sobre a consistência governamental de que precisaremos nos tempos que se avizinham, sobretudo com a complexa operação de construir um orçamento para 2021 que corrija fragilidades estruturais que a pandemia revelou e que possa relançar a economia para uma recuperação tão rápida e intensa possível.

Tudo o que começa mal tende a acabar mal, não necessariamente sob uma deflagração que prepare um começo a partir do zero. Há outros modelos de “acabar mal” que se prolongam o tempo debilitando e, pior do que isso, comprometendo irremediavelmente o novo começo.

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