(Estou estupefacto e temendo ameaças futuras. O empréstimo
ao Novo Banco e a aparente contradição informativa entre António Costa e Mário
Centeno sobre a sua existência são coisas de um outro mundo que não se
recomenda para os tempos que se avizinham. Sujeitar um país frágil como Portugal ao experimentalismo da solução para o
Novo Banco, inventada sabe-se lá por quem e, honestamente temos de o admitir,
surgida num contexto de alternativas possíveis igualmente arriscadas, teria de
produzir consequências a prazo. E, entretanto, os autores reais das falcatruas
continuam a aguardar que a justiça tropece nas suas próprias limitações).
Não me parece que a contradição registada entre o primeiro-Ministro e o ministro
das Finanças seja uma invenção jornalística. Muito menos terá origem nalguma
armadilha preparada pela esquerda mais à esquerda da agora expectante
geringonça. Sabemos que a tensão da decisão política está ao rubro e que nem
tudo é coordenável ou passível de informação a quem de direito nos processos. E
também não parece plausível que António Costa tenha passado por uma quebra momentânea
de atenção.
Neste contexto de presunções plausíveis, o que inquieta nesta contradição
de registo é a margem de liberdade que permite para todas as deduções. A
matéria dividiu o governo? Há razões na origem do empréstimo, inerentes à
situação do Novo Banco, que não tenham sido reveladas e que anunciem caça
grossa em termos de viabilidade do banco e por isso passível de arruinar todo o
experimentalismo com que BCE, Comissão Europeia, Banco de Portugal e governo de
então decidiram “cobaiar” este país? Será que Mário Centeno forçou a nota para
se pôr ao fresco em direção a dois destinos provavelmente fechados, como a
governação do Banco de Portugal ou a continuidade no Eurogrupo? Será que o relacionamento
entre as duas personalidades é mais problemático do que tem transpirado?
Qualquer das hipóteses incomoda. E pesa sobre a consistência governamental
de que precisaremos nos tempos que se avizinham, sobretudo com a complexa
operação de construir um orçamento para 2021 que corrija fragilidades
estruturais que a pandemia revelou e que possa relançar a economia para uma
recuperação tão rápida e intensa possível.
Tudo o que começa mal tende a acabar mal, não necessariamente sob uma deflagração
que prepare um começo a partir do zero. Há outros modelos de “acabar mal” que
se prolongam o tempo debilitando e, pior do que isso, comprometendo irremediavelmente
o novo começo.
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