quinta-feira, 28 de maio de 2020

VÁRIAS E CURTAS



(Hoje é dos tais dias, não sei se por culpa do calor se devido a um dia intenso de reuniões on line, que os temas possíveis para blogar são tão variados que se justifica um modelo de curtas e várias. Não sei se serei capaz de encontrar um fio condutor para tamanha variedade).

A primeira nota vem de uma moratória europeia para nos voltarmos a convencer que a União Europeia é ainda viável e, que uma vez mais, após o caos e a divergência de opiniões, lá se consegue uma solução de compromisso. Macron e Merkel decidiram dar o peito às balas e a Presidente da Comissão Europeia Ursula von der Leyen (e sei, não por informação privilegiada, mas por gente insuspeita de favorecimento de opinião, que a “nossa” Elisa Ferreira se tem batido competente e incessantemente por um bom resultado) apresentou o Plano para uma União de nova geração. Com a importante brecha na ortodoxia até aqui reinante de que a Comissão Europeia irá ao mercado financiar-se para aplicar em subvenções não reembolsáveis e em empréstimos, sem beliscar as políticas de coesão e a política agrícola comum. Que existe um mistério ainda por explicar que pode ensombrar este momento e que consiste na estranha aliança dos forretas (Áustria, Dinamarca, Países Baixos e Suécia) não o podemos ignorar. Aliás não penso que o denominador comum dos quatro frugais seja a frugalidade, mas antes uma significativa perda dos valores da solidariedade europeia, curiosamente comum a várias orientações políticas e a social-democracia mostra ao que chegou em alguns cantos da Europa.

Podemos questionar se o rombo orçamental provocado pela pandemia em Portugal poderá ou não ser colmatado com esta ajuda. Imagino que não, já que a retoma da atividade económica não vai ser indiferente aos rumos de prolongamento ou desaceleração forte da pandemia e tudo ainda é indeterminado nesta altura, porque ainda não as comunicações aéreas a bombar. O José Pacheco Pereira incomodava-se ontem no Circulatura com o risco das ditas reformas estruturais da condicionalidade trazerem a missa do costume, com o enviesamento do costume dessas reformas em favor de opções de organização económica e social ideologicamente teleguiadas. Não ouvi nada disso no discurso de Ursula. O que ouvi foi a necessidade de os países demonstrarem que aplicam o guito em linha com as agendas europeias. O que não me parece nada de obsceno, afinal é a Comissão Europeia que vai ao mercado, logo as agendas europeias (por mais necessário que seja discuti-las criticamente e não como papalvo à espera de fundos) não podem estar fora da equação. Mas será esta a condicionalidade? Veremos, mas recuso-me a acreditar que o bando dos quatro comprometa o ressurgir da esperança.

Uma outra curta reflexão ainda está voltada para a Espanha e para o desconchavo que a pandemia abriu na governação central e multinível. Por mais lamentável e choque que isso nos provoca, a Espanha vizinha nem consegue contar decentemente os seus mortos com a pandemia. Ponto e é bastante para percebermos o desconchavo.

Esta crise pandémica tem trazido ao nosso conhecimento mediático gente do melhor em termos de coerência, sensatez e serviço público. Gente que felizmente ofusca os videirinhos destas coisas que pequeninos à Marques Mendes ou pequeninos de cabeça se colocam a toda a pressa em bicos de pés para ficar nas fotografias a qualquer preço, mesmo que seja por terrorismo opinativo. O Professor António Sarmento, Diretor do Serviço de Infecciologia do Hospital de S. João é uma dessas personalidades sensatas que sabe bem ouvir e que compensa todo o ruído que a comunicação nos traz. Pois o Professor com a sua candura e modéstia veio dizer-nos que é preciso coerência comunicacional para conquistar a dita confiança. Assim, ele não compreende, e como bem pensa, como é possível autorizar voos das companhias aéreas sem encurtamento significativo de lugares ao mesmo tempo que se impõe a distância social como um modelo. E tem toda a razão ao denunciar essa incoerência. Bem sei que a imagem das frotas aéreas paradas em terra impressiona qualquer um, sobretudo aos mais sensíveis ao taxímetro das despesas por cada dia de imobilização de frota e pessoal. Por isso, penso que a questão do transporte aéreo sobretudo o de longo curso dificilmente voltará a ser o mesmo nos tempos mais próximos.

A terceira curta é por inerência a questão da TAP. Temos aqui outro domínio em que a evolução do quadro normativo europeu fez ascender à ideia de pecado mortal a nacionalização das companhias aéreas. Neste quadro perturbado, a posição mais sensata parece ser a de António Lobo Xavier que se insurgiu contra a belicosidade dos administradores e gestores da TAP para lidar confortável e eficazmente com o acionista Estado. E já sabemos que o Engº Jorge Coelho está disposto a empenhar as barbas que não tem pelas boas práticas de gestão do então Engº Fernando Pinto que ao que parece deu carta positiva à entrada do artista atual. Imagino que o Pinto se tenha dado bem com o então ministro da tutela Coelho. Mas dispensávamos bem ter-nos metido até ao pescoço na compra ruinosa da empresa de manutenção no Brasil. Todos somos sérios até prova em contrário, mas um brasileiro em Portugal a recomendar a compra de uma empresa brasileira põe os cabelos em pé até ao mais careca. Por isso, até dou de barato que a nacionalização esteja inviabilizada, mas exigir uma administração que não crie falsos problemas é o mínimo que se impõe para colocar os aviões no ar. Com o país de Bolsonaro e dos asnos que viabilizaram o seu acesso ao poder (alguém se lembra das razões que determinaram o “impeachment” de Dilma?) todo o cuidado é pouco até em termos de proteção pandémica.

E finalmente a revelação uma vez mais de uma das nossas mais profundas insuficiências estruturais. O Público de hoje transmite-nos a evidência de que o tão esperado programa Ferrovia 2020, com 2.000 milhões de investimento, fica aquém de uma efetiva modernização infraestrutural. Por outras palavras, essencialmente eletrificação e sinalização mais moderna, mas nada de correções estruturais de vias para tirar todo o partido da velocidade e ganhar competitividade na mobilidade tempo. Dou-vos um exemplo para ilustrar bem este faz que faz. Há por aí boas almas que acreditam que o Alfa Pendular poderá evoluir até Vigo, satisfazendo os galegos e proporcionando à parte portuguesa a oportunidade de enlace fácil com o comboio de alta velocidade entre Vigo e Madrid. Já por repetidas procurei demonstrar que esse projeto é incompatível apenas com a eletrificação e sinalização moderna que está em curso. São necessárias intervenções físico-infraestruturais que não estão equacionadas. Por isso, sempre disse que nunca veria o Alfa a passar na minha varanda de Seixas, com a linha de caminho de ferro do Minho a passar num horizonte visual de 200 metros. Mas as boas almas continuam a insistir. O artigo do Público mostra que tenho razão. Na grande generalidade das linhas, incluindo a do Norte, não basta a modernização de segurança e sinalética para assegurar a competitividade de uma ligação que desde os meus tempos de serviço militar em Lisboa (1973) anda pelas 3 horas. Com ou sem pandemia.

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