sexta-feira, 10 de novembro de 2023

O DISCURSO DA DESQUALIFICAÇÃO COMEÇA A NÃO PEGAR …

 

(Jornal Expresso on line - https://leitor.expresso.pt/semanario/semanario2663/html/economia/emprego/trabalhadores-com-ensino-superior-duplicam-desde-2009)

(Em tempos de ego coletivo a caminhar para a depressão, designadamente na sequência de uma vasta e variada repercussão política externa do tsunami de 7 de novembro, identificar aspetos de evolução estrutural positiva na economia portuguesa ajuda a manter a saúde mental coletiva. Com base nas recém-publicadas Estatísticas do Emprego do INE (novembro de 2023) e comparando essa informação com dados de 2009, o Expresso elaborou um pequeno artigo precioso que utilizarei juntamente com a publicação do INE para dar conta de uma evolução estrutural, esta não há dúvida de que é uma mudança estrutural, observada em cerca de 14 anos. A conclusão que retiro dessa análise corresponde ao título deste post: o discurso da desqualificação começa a não pegar e justifica a necessidade de uma outra narrativa para explicar as razões do nosso ainda baixo nível de desenvolvimento. E emerge uma conclusão complementar que aponta para a responsabilização da gestão e do investimento empresarial em equipamento e em fatores imateriais de competitividade na resposta que é preciso oferecer do interior das empresas e das organizações à melhoria de qualificações.)

Os dados da comparação realizada pelo Expresso são em si eloquentes.

Num contexto geral em que o emprego ultrapassou pela primeira vez os cinco milhões de indivíduos e com a taxa de desemprego a manter-se ligeiramente acima dos 6%, a evolução observada em cerca de 14 anos (do 1º trimestre de 2009 ao 3º de 2023) aponta para: aumento de 799.000 para 1.624.000 empregados com ensino superior e também para um aumento de 792.000 para 1.622.000 empregados com ensino secundário e pós-secundário. Obviamente que, em contrapartida desta evolução estrutural positiva, os empregados com educação no máximo de ensino básico (9º ano de escolaridade) diminuíram de 3.426.000 para 1.769.000. Toda esta evolução foi operada com claro predomínio de contratos sem termo, os quais em novembro de 2023 representavam cerca de 82,5% do emprego total, limitando a precarização a 17,5% do emprego total.

O trabalho do Expresso identifica ainda que as atividades de saúde humana e apoio social, as atividades de consultoria, científicas, técnicas e similares e as de comunicação e informação são os drivers mais importantes do aumento do emprego nesses 14 anos (mesmo que o turismo tenha dominado a evolução mais recente). Tendo em conta que as atividades de consultoria, científicas, técnicas e similares e as de comunicação e informação são fortemente intensivas em trabalho qualificado e parcialmente também as de saúde humana, teremos encontrado os principais drivers da melhoria estrutural das qualificações do emprego.

Interpretando tudo isto, podemos dizer que, sobretudo na sequência da melhoria da qualificação inicial de jovens e da vertiginosa subida da frequência do ensino superior e mais reduzidamente dos esforços de formação contínua de adultos, o peso do stock das baixas qualificações se vai esbatendo no emprego total. Em linha com esta tendência, o peso das baixas qualificações no desemprego (cerca de 42%, com 20% de desemprego jovem dos 16 aos 24 anos no desemprego total) mostra também que a qualificação vai tendo o seu retorno em matéria de acesso ao emprego.

Concluo que talvez não estejamos a prestar a devida atenção a esta mudança estrutural da economia portuguesa, recordo com cerca de 82% do emprego com contratos sem termo. Impõe-se pelo menos mudar a narrativa dos débeis aumentos ou níveis de produtividade. A melhoria das qualificações está segundo estes números dentro das empresas e das organizações. O discurso da desqualificação começa a ser desajustado. Talvez seja importante centrar a narrativa nas condições de gestão, organização e remuneração de retorno desta melhoria de qualificação. O que muda substancialmente o debate.

 

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