Interrompo hoje o meu quase total foco nas questões associadas ao terramoto político em curso para aqui deixar algumas referências relativas ao que também foi a normalidade daqueles meus dias de aparente desligamento face à restante realidade circundante. E que fantástica normalidade foi essa!
Acima, o registo da “Última Aula” do Professor Manuel Matos Fernandes (vulgo “Manecas”) proferida com um raro brilho no Auditório da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto. Um momento belíssimo por uma infinidade de razões, as menores das quais não deixando de ser a enorme qualidade e originalidade da intervenção (“A Engenharia Portuguesa e o modo como foi moldada pelo nosso Território e pela nossa História”) e a atitude espessamente humilde do autor (das menções às pessoas e instituições que o influenciaram ao longo da vida e da carreira à alusão ao movimento estudantil anterior ao 25 de abril em que militou, do forjar de competências de engenharia por força da nossa diversidade geológica, hidrográfica e topográfica ou dos avanços a que a expansão marítima portuguesa obrigou na arte da fortificação e urbanização, da Barragem do Picote, onde “a natureza e a engenharia melhor se combinam”, à citação final de Michael Sandel: “Não podemos pensar em objetivos e projetos comuns sem nos reconhecermos como membros de uma comunidade. (...) Apenas na medida em que dependemos dos outros, e reconhecemos essa nossa dependência, é que temos realmente razão para valorizar as suas contribuições para o nosso bem-estar coletivo.”). Uma sessão notável e um privilégio dela ter sido parte!
Abaixo, três outros momentos especialmente gratificantes: (i) o almoço-debate da Secção Regional do Norte da Ordem dos Economistas, magnificamente protagonizado por Carlos Costa (uma intervenção iniciada com uma apropriação muito pessoal de um verso de Alexandre O’ Neill ― “Portugal é uma questão que eu tenho comigo mesmo” ― para a aplicar ao Norte de onde provem e onde localiza a maior presença das forças de transformação existentes no País, não sem apontar a escassa autonomização do sistema regional de inovação como a maior limitação institucional dominante num quadro em que sustenta que a “libertação da Região”, a tomada em mãos do seu futuro económico, corresponde a uma questão de importância maior perante as reivindicações de autonomia política); (ii) a comemoração do septuagésimo aniversário da primeira aula ministrada na Faculdade de Economia do Porto (1953), com o então aluno do curso inicial José Roquette a passar a sua experiência a duas turmas de jovens alunos da atualidade; (iii) a celebração do 43º aniversário da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto, juntando os tradicionais momentos de premiação e homenagem a duas intervenções tão diversas quanto brilhantes de José Pacheco Pereira (mais centrado na história do movimento estudantil) e Alberto Amaral (mais centrado na utilidade social da universidade ao longo da história e nas suas quase inacreditáveis particularidades nacionais) sob o mote temático “A Democracia e o Ensino Superior ― os últimos 50 anos e os desafios do futuro”.
Tempo ainda para uma abençoada fugida a mais uma, a número 251, das “Quintas de Leitura” do Teatro do Campo Alegre (CMP) sob a criativa programação de João Gesta (velho conhecido da FEP de meados dos anos 70) e onde tive o grato e surpreendente prazer de encontrar uma colega (Isabel Marques) desses mesmos tempos que andou todas estas décadas pelo mundo em estimulantes contributos de resposta a desafios do desenvolvimento encarados pelo lado da componente financeira. Um encontro cheio de uma emotividade indisfarçável porque feita de tantas e tantas pequenas coisas que nos uniram ou até vagamente dividiram.
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